Está a chover
E a nevar,
A raposa no quintal
E a Maria tecedeira
Com o rabo
Na pilheira.
A mulher do meu irmão
Varre a casa e faz na meia
Com a saia varre e casa
com o c... apaga a candeia.
Muito simples este versejar popular de outros tempos. A gente nova terá algum dificuldade em entender, porque lhe falta a vivência do contexto situacional... Sabem lá eles o que é a pilheira! Cheira-lhes a estranho isto de apagar a candeia e não entendem a história do "com a saia varre a casa"...
Mas o que este simples versejar tem de história, de crítica e de ironia!
Referência ao papel da mulher naqueles tempos: tecer e fazer na meia (meias, camisolas, etc);
cuidar da casa ( varrer, candeia, tarefas domésticas - referência ao cuidado com as galinhas através da alusão à presença da raposa).
Há 50, 60 anos atrás, que aldeias tinham electricidade? Poucas. A iluminação vinha através das candeias a petróleo.
Nessa altura, havia nas famílias rurais uma divisão clara de tarefas: as mulheres exerciam os trabalhos dentro de casa e os homens os de fora de casa. Até nos cuidados com os animais isso era notório: as galinhas, os porcos, os coelhos estavam ao cuidado das senhoras; mas as vacas, os burros e os rebanhos eram da responsabilidade dos homens. Tarefas domésticas, para as esposas; cultivo dos campos, para os maridos.
Por outro lado, há nestes versos muito de crítica e ironia ao trabalho da mulher: descuidada - nem sequer se apercebe da raposa que vem às galinhas; friorenta - passa a vida enfiada na lareira; pouco asseada e arrumada - com a saia varre a casa; gorda - com o c... apaga a candeia.
Ao ler estes versos, recordo-me sempre da cantiga "O que eu andei para aqui chegar!"
Realmente a evolução nas últimas décadas foi absolutamente galopante. A nível material e a nível de mentalidades. Por mim, ainda bem.
Que mulher se sente HOJE retratada nestes versos??? Nenhuma.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.