terça-feira, 31 de outubro de 2023

"O clericalismo é um chicote, é um flagelo, é uma forma de mundanidade que suja ..."



Há semanas,  vi um vídeo na internet mostrando a entrada de um pároco numa das suas novas paróquias - a chamada "tomada de posse", embora a expressão me enfastie. Diocese do sul do país. Este sacerdote era jovem.
Chamou-me a atenção a forma como o padre se apresentou: cabeção de metro e meio, batina, romeira, faixa e tricórnio eclesiástico. A expressão pura e dura do clericalismo.
Quanto mais o Papa fala do grande mal que é o clericalismo na Igreja, mais alguns se esforçam por o trazer para a praça pública.  E são sobretudo os padres mais novos que navegam nas águas passadas do conservadorismo e ultraconservadorismo. Felizmente, é bom e saudável dizê-lo,  tal não acontece com todos os padres novos.  Ainda bem que alguns não são todos.
"O hábito não faz o monge", diz o povo. Mas parece que para alguns o monge é sobretudo o hábito. 
Como se explica este ressurgir de expressões clericalistas entre os sacerdotes mais novos?
Atrevo-me a apresentar algumas tentativas de explicação, consciente da minha limitação:
1. Remar contra a maré. Quando à frente da Igreja prevalece uma linha muito conservadora, os jovens reagem com propostas e atitudes mais progressistas; quando, como é o caso atual, à frente da igreja prevalece uma linha progressista, os jovens reagem com propostas e atitudes conservadoras/ultraconservadoras.  Está no "sangue jovem".
2. Necessidade de afirmação. Num tempo em que o prestígio social do clero cai a pique, a vestimenta funciona como "um marcar de terreno", um  "toca a reunir", um "remeter para velhos tempos". Ouvi uma vez a um Monsenhor já falecido, padre importante na sua diocese, uma afirmação curiosa. Estávamos em finais da década de 70, quando as vestes clericais estavam a ficar fora de uso. O tal Monsenhor dizia: "Sabem porque continuo a andar de batina e cabeção? Porque transporto comigo o prestígio da Igreja". 
 Ora aí está!
Que bom seria que a afirmação de tais padres novos NÃO passasse por batinas e cabeções,  MAS passasse sobretudo pela iniciativa e dinamismo pastorais, pela criatividade, pelo "pelo cheiro a ovelhas", por oferecerem uma Igreja em saída.... E com isso contagiassem os mais velhos...
3. Formação dos Seminários.  Felizmente hoje há  situações a que os Seminários vão estando atentos: a presença do feminino na formação dos seminaristas, maior preocupação com o amadurecimento afetivo dos candidatos, uma visão positiva da sexualidade humana, um contacto assíduo com a realidade do nosso mundo, a frequência da Universidade, etc
Mas dada a escassez de vocação, os seminários são muitas vezes coutadas de jovens ligadas a grupos e movimentos tradicionalistas e ultratradicionalistas. E é precioso que os seminários sejam muito seletivos neste ponto.  Esses movimentos tradicionalistas tendem a queimar os jovens por dentro. Ficam como terra queimada onde nada de novo nasce.
Bem a propósito. Reparem neste texto do Papa Francisco. 5 estrelas!     
                                                                                                                             
«(...) Ou a Igreja é o povo fiel de Deus em caminho, santo e pecador, ou acaba sendo uma empresa de vários serviços, e quando os agentes pastorais tomam esse segundo caminho, a Igreja se torna o supermercado da salvação e os sacerdotes simples funcionários de uma multinacional.
É a grande derrota a qual o clericalismo nos leva. E isto com muita vergonha e escândalo (basta ir às alfaiatarias eclesiásticas de Roma para ver o escândalo dos jovens padres a experimentar batinas e chapéus ou albas e sobrepeliz com renda […] O clericalismo é um chicote, é um flagelo, é uma forma de mundanidade que suja e provoca dano ao rosto da esposa do Senhor; escraviza o santo povo fiel de Deus […] E com que naturalidade falamos dos 'príncipes da Igreja', ou das promoções episcopais como promoções de carreira! Os horrores do mundo, o mundanismo que maltrata o povo santo e fiel de Deus.»
(Papa Francisco, 25.10.2023)

Que bom seria!
Que padres novos e velhos; leigos novos e velhos; religiosos novos e velhos... TODOS, TODOS, TODOS  vivêssemos centrados em Cristo e descentrados nos irmãos. 
E a nossa preocupação visível, testemunhal, fosse Jesus Cristo. 
Que não nos pregássemos a nós, mas apenas Jesus Cristo!

sexta-feira, 27 de outubro de 2023

A NOVA EDUCAÇÃO DAS NOSSAS CRIANÇAS E DOS NOSSOS JOVENS. PORNOGRAFIA DESDE OS 9 ANOS

Nova “pandemia assustadora” tem consequências imprevisíveis (e há pais em pânico)

 

Os jovens começam a ver pornografia cada vez mais cedo, logo a partir dos 9 anos de idade. Está, assim, a criar-se uma “Geração Porno” e há pais “em pânico”, sem saberem o que fazer, perante o que já é referido como uma nova “pandemia”.

O documentário “Geração Porno” do canal espanhol TV3 alerta para uma nova realidade que ainda não está a merecer a devida atenção, mas que pode ter consequências trágicas nos próximos anos.

Há cada vez mais adolescentes a usarem a pornografia para se educarem. E o pior é que tentam transferir aquilo que veem nos vídeos porno para a vida real.

A pornografia tornou-se fundamental para esta nova geração, com as crianças a terem contacto com ela cada vez mais cedo.

Muitos jovens começam a ver vídeos pornográficos logo aos 9 anos de idade. Com 12 anos, quase metade veem pornografia e aos 15 anos, a percentagem sobe para os 90%, conforme dados divulgados pelo documentário da TV3.

“Tal como existe uma Geração Z ou os Milenial, é razoável pensar que estamos a criar uma geração de meninos e meninas pornográficos “, destaca o psicólogo e sexólogo José Luis García no documentário.

Para estes jovens, a pornografia é como “uma droga”, uma verdadeira adição. “Porno e pijama” é a solução para lidar com o aborrecimento e o sexo real já parece “pouca coisa”.

Estamos na “origem de uma pandemia assustadora“, de acordo com a análise do psicólogo Juan Carlos Prieto que é especializado em dependências e que também foi ouvido para o documentário.

A pornografia é parte relevante da vida destes jovens, e está a moldar a forma como vivem a sua sexualidade com outras pessoas. E isso acaba por afectar também os jovens que não têm contacto com o universo porno.

Há 800 milhões de sites pornográficos, cada um com uma média de 12 milhões de vídeos porno, de acordo com dados da revista The Economist.

E “88% dos vídeos porno contêm violência física“, com mulheres a serem estranguladas ou a terem os cabelos puxados, como nota o El Mundo. Mas há coisas ainda piores!

No documentário da TV3, quando perguntam aos jovens qual foi “a coisa mais aberrante” que já viram na pornografia, um rapaz refere “uma miúda esquartejada a ser f*****“.

É o que se chama a “pornografia de abutre”, como explica o realizador de filmes pornográficos Antonio Marcos ao El Mundo, salientando que o objectivo, neste caso, é oferecer “algo que seja o mais nojento possível para chamar a atenção” e os cliques dos jovens.

Pais chocados e em pânico

“O que faço?” “O que lhe digo?” “Como posso controlar isto?” Estas são as dúvidas dos pais que se apercebem do que se passa com os seus filhos. E é “pânico” o que sentem na desorientação sobre como lidar com o assunto.

Alguns pais “não dão crédito ao que os seus filhos contam” porque “não o podiam imaginar”, realça a realizadora Oiane Sagasti.

Em outros casos, os pais ficam em choque com as respostas dos filhos que dizem que assistem a filmes porno porque estão “aborrecidos” ou “stressados”.

Mais espantados ficam quando referem que tentam reproduzir nas suas relações amorosas, as cenas pornográficas que são protagonizadas por actores e que, quase sempre, ilustram o sexo de forma irreal.

Há relatos de miúdas que vão a sex shops em busca de sprays para desensibilização da garganta porque os namorados querem que elas façam sexo oral como as estrelas porno. 

O grande problema é que a pornografia está à mão de semear na Internet. É muito fácil de aceder, é gratuita, “dá prazer” e tem “um poder aditivo superior à cocaína“, “o que incentiva o consumo”, como destaca o sexólogo José Luis García.

É “um super estímulo” e quando se consome de forma continuada, chega-se a um dado momento em que uma relação real já “não resulta suficientemente satisfatória”, acrescenta o sexólogo.

Então, os jovens esperam e querem o que o porno mostra – sexo em grupo, sexo anal, violência, humilhações – e tudo isso sem preservativo.

“Se constróis o teu desejo a ver sempre violência, depois vais precisar dela para te excitares”, conclui o documentário.

Mais crimes sexuais cometidos por menores

Nos últimos tempos, têm sido reportados vários casos de crimes sexuais cometidos por menores em países como Espanha e Itália, nomeadamente com violações em grupo.

Em Espanha, o número de crimes sexuais cometidos por jovens com idades entre os 14 e os 17 anos aumentou 14% num ano, de acordo com a Euronews.

Em Itália, o número é mais elevado, com um aumento de 15,7%, segundo dados da mesma fonte.

Ainda recentemente foi notícia o caso de seis adolescentes, com idades a rondar os 14 anos, que violaram uma menina de 11 anos na casa de banho de um centro comercial da cidade espanhola de Badalona.

Há “cada vez mais rapazes nos centros de detenção juvenil por crimes contra a liberdade sexual e cada vez mais condenações por este tipo de crime”, revela na Euronews o juiz de menores em Toledo (Espanha), José Ramón Bernácer, que trabalha com este tipo de casos há 17 anos.

Bernácer revela que o número de casos que ouviu duplicou nos últimos seis anos, lamentando a “falta de educação sexual” que se reflecte em comportamentos agressivos e “machistas”.

“As crianças que não têm educação ou experiência sexual veem filmes pornográficos feitos para adultos e confundem o que é o sexo“, repara a psicóloga especializada em violência de género e stress pós-traumático María Rosario Gomis, também em declarações à Euronews.

“Como não têm nada com que comparar, assimilam a pornografia agressiva e pensam que a sexualidade é isso“, conclui, reforçando a importância da educação sexual nas escolas e defendendo legislação no âmbito do acesso livre à pornografia por parte de menores. 

Susana Valente, ZAP, 25 OUTUBRO, 2023

Os Heróis nacionais de Dom Américo

"A esmagadora maioria dos nossos padres são heróis nacionais", disse Dom Américo no improvisado discurso de uma tomada de posse "fora da caixa", como Bispo de Setúbal.
Gostei de ouvir. Fez-me bem ouvir.
Não porque o mereça, não porque me julgue acima dos leigos ou mais sacrificado que os outros. Não porque precise de elogios como de carvão para a máquina andar. Não. Nem pensar.
Mas faz-nos bem ver alguém, um Cardeal Américo Aguiar levantar "a moral das tropas" presbiterais. Sobretudo sabe bem, quando, mais uma vez, pela enésima vez, o Papa Francisco, numa intervenção sinodal, malhou forte e feio no clericalismo, que ele diz ser e é uma verdadeira praga de mundanismo (sob capa) espiritual infiltrado na Igreja.
Não é que o Papa não tenha razão nem clarividência no diagnóstico, na denúncia e na terapia da doença. Tem carradas de razão.
Mas não seria muito pedir a Dom Américo, o mais novo (e tantas vezes o Espírito fala pela boca do mais novo, diz São Bento na Regra), que, no próximo encontro pessoal com o Papa lhe diga que nós, os padres, temos apanhado merecida porrada. Mas o que é de mais é moléstia.
Sinto que é altura de palavras mais estimulantes e edificantes para a conversão pessoal e pastoral do clero. Talvez elas tenham sido proferidas mas pouco divulgadas. Amo e aprecio imenso o Papa.
Sei que ele mesmo apreciará que discordemos dele em algumas coisas e lho digamos com "parrésia". Neste momento, acho que nos regenera e motiva mais a valorização positiva do que uma censura, mesmo se merecida. Os padres também hão de fazer parte desses "Todos, todos, todos" que se quer acolher. São horas de levantar a cabeça, heróis da missão em terra e além mar.
Amaro Gonçalo, Facebook

quinta-feira, 26 de outubro de 2023

 

sexta-feira, 13 de outubro de 2023

Dúvidas manhosas!

 
Nos últimos cinquenta anos, não houve um Papa tão contestado, dentro da Igreja, como o Papa Francisco. Aliás, o Papa Francisco é claramente mais contestado dentro da hierarquia e leigos comprometidos da Igreja, do que pelos fiéis leigos, sem compromisso ou mesmo pelos não batizados. Algo que, seguramente, nunca aconteceu nos últimos 50 anos e arriscava-me a dizer (podendo estar a proferir uma asneira), que há alguns séculos que não havia tais sentimentos em relação a um Sumo Pontífice, com a particularidade de, neste caso, o mesmo ter uma enorme aceitação e unanimidade junto do Povo Cristão e, até, não Cristão.

Para mim, isto deve-se verdadeiramente a dois aspetos essenciais: diria que um deles é o facto de o Papa Francisco ser o primeiro Papa da História a falar diretamente para as pessoas e com as pessoas. Ao contrário dos seus antecessores, não precisa de intermediários. Na verdade, dispensa-os. Antes dele, os documentos da Igreja, as mensagens papais e outro tipo de intervenções do Santo Padre necessitavam de ser explicadas pelo restante clero ou católicos empenhados na pastoral.

Pelo contrário, as palavras de Francisco são claras e compreendidas por todos e, os que outrora faziam dessa interpretação papal, não só um trabalho, mas sobretudo um poder, sentem-se, agora, desautorizados e, também, usando um eufemismo, “desempregados”. Um sinal disto torna-se visível na quantidade de gente que, em todos os fóruns contemporâneos, a começar nas redes sociais, vem explicar e complexificar as palavras do Papa Francisco, assim que ele lança um documento ou profere uma simples homilia. Ainda há dois meses, quando em Lisboa pronunciou o famoso “todos, todos, todos”, foram mais aqueles que nas redes sociais vieram explicar e complexificar o que o Papa Francisco queria dizer com isso, do que aqueles que vieram louvar a simplicidade profunda das suas palavras – fortemente assentes no Evangelho e no legado de Cristo Jesus –, que todos as pessoas que escutaram e perceberam. O que o Papa diz não precisa de explicação, precisa de aceitação!

O outro aspeto tem a ver com as redes sociais e o ambiente digital. Sendo Francisco o primeiro Papa da era da generalização e utilização massiva destes media, há que pensar em várias características novas. O conteúdo das suas palavras, não só é ponderado em termos do seu valor comunicativo, como é de fácil e de largo alcance. Se noutros tempos as palavras dos papas eram mediadas por várias pessoas (Bispos, Padres ou catequistas), agora chegam, em direto, a todos e a mediação existe, não está fora de causa, mas é uma mediação específica, com caraterísticas que importa conhecer. A iliteracia mediática e falta de honestidade intelectual e de sinceridade nas relações de algumas dessas mesmas pessoas, também provoca, não só um mal-estar, como um desvio do que é essencial, como do consenso que é necessário a Igreja Católica ter, para continuar a ser uma voz e uma presença credível no Reino de Deus.

O exemplo perfeito disto está nas perguntas manhosas que cinco cardeais fizeram, publicamente, ao Papa, sobre matérias que estão a ser faladas no atual sínodo. O Papa Francisco respondeu sinceramente às primeiras, mas como a resposta não agradou a esses senhores (tal como fazem as crianças, até arrancar dos seus pais a resposta que querem), voltaram a perguntar ao Papa Francisco de outra forma, como se o Santo Padre tivesse reprovado no primeiro exame e tivesse de repeti-lo, numa época de recurso. Não é liberdade de expressão; é mesmo discurso de ódio contra o Santo Padre. E nunca ninguém gosta de ouvir desavenças familiares, sobre heranças, quer seja na taberna da aldeia ou em alguma rede social. Aqui a situação é clara: há cinco pessoas que, não tendo o destaque desejado nas habituais salas onde trocam coscuvilhices e nos espaços onde Francisco, no presente, promove trabalho árduo e importante para a Igreja e para o mundo, vieram para o espaço mediático, dizer mal do seu Pai, da sua família. No mínimo, não é bonito; no máximo não é o que se espera de gente que se diz seguidora de Cristo – mas só da maneira que convém. Em suma: não é de boas pessoas, porque as boas pessoas têm a capacidade de perceber que não são infalíveis e que a sua visão do mundo não deve ser imposta aos demais. Esses, costumam ter outro nome: ditadores.

Será mais útil que rezemos e peçamos ao Espírito Santo que acompanhe todos os participantes no Sínodo, de modo que a Igreja possa crescer, unida e forte e capaz de acolher todos, todos, todos, pois essa seria a maior graça que poderíamos receber. Como diz a Oração Adsumus Sancte Spiritus.

“Nós somos débeis e pecadores: não permitais que sejamos causadores da desordem; que a ignorância não nos desvie do caminho, nem as simpatias humanas ou o preconceito nos tornem parciais. Que sejamos um em Vós, caminhando juntos para a vida eterna, sem jamais nos afastarmos da verdade e da justiça. Amen”.

Fonte: aqui

quinta-feira, 12 de outubro de 2023

A minha expectativa do sínodo

 

Quando em 10 de outubro de 2021 o Papa Francisco abriu o sínodo sobre a sinodalidade, ninguém tinha a certeza do seu alcance. Sabia-se que seria algo importante na Igreja, ao menos, pela sua duração e pelas etapas estrategicamente propostas: local, continental e universal. As expectativas atingiram de imediato os chamados progressistas e conservadores dentro da Igreja. Os primeiros, entusiasmados, a pensar que se iriam mudar muitas regras e leis, e os segundos, preocupados, a pensar exactamente no mesmo. Que o sínodo é importante, atesta-o o facto de, entretanto, o Papa ter decidido prolongar em mais um ano a sua duração e em promover duas assembleias sinodais. Os temas que a comunicação gosta de badalar são capa. Os jornalistas não perdem a oportunidade para insistir na ordenação de mulheres, a bênção de casais LGBTQIA+, a alteração do celibato, entre outros assuntos sensíveis similares. Muita atenção se tem centrado nestes assuntos, na expectativa do que poderá vir a suceder. 
Desde outubro de 2021 que tenho acompanhado com atenção este processo. Foi-me dada a oportunidade de liderar algumas reflexões e pronunciamentos. Vou lendo o que o Papa vai dizendo, assim como alguns teólogos que aprecio. Acompanho as notícias. Rezo a Deus pelos bons frutos de tudo o que está a ser feito. Rezo bastante. Mas rezo sobretudo a pedir ao Senhor Deus que ajude os cristãos, todos eles, sem exclusão, a perceber, de uma vez por todas, que a Igreja somos todos nós. Se este sínodo apenas tivesse servido para isto, eu já ficava muito satisfeito. Todos na Igreja temos igual dignidade e missão. O que difere é o modo como o fazemos.
Fonte: Confessionário dum Padre, aqui

sábado, 7 de outubro de 2023

Os cardeais começaram no segundo milénio, podem acabar no terceiro?

 Veja aqui

Só um pequeno excerto:

"Os títulos de cardeais, cónegos, monsenhores ou outras “dignidades” são muitas vezes vistos como uma espécie de prémio de carreira. Servem para fazer distinção de cargos, honrarias e pessoas. Tal como as formas de tratamento: eminências, reverendos ou suas reverências (ou seja, que devem ser reverenciados), “Dom” (abreviatura do Domini, os senhores com os seus domínios)… Uns e outras são uma negação absoluta de princípios do Evangelho no qual a Igreja se funda: “Não vos chameis mestres, porque um só é o vosso Mestre, que é Cristo.” (Mateus 23, 10); “Reconheço que Deus não faz acepção de pessoas” (Actos dos Apóstolos 10, 34).

Ainda mais, o cardinalato é uma instituição que vem dos séculos XI/XII. O próprio nome de consistório tem origem na antiga Roma: era “o conselho privado do imperador formado pelos seus colaboradores mais próximos”, como se explica na página do Pontifício Instituto Superior de Direito Canónico, do Rio de Janeiro (Brasil)."

sexta-feira, 6 de outubro de 2023

CATEQUESE DIFERENTE = AUTÊNTICA - “SÊ A MUDANÇA QUE QUERES


 Que renovação (mudança) querem aqueles que a pedem/exigem à Igreja? A que Igreja se referem? Entre as razões continua entranhada a ideia de a Igreja ser o clero (papa, bispos e padres) e o resto “paisagem”. Por isso, quando pedem mudança exigem-na unicamente a pensar no clero e entendem-na como maior abertura (disponibilidade) para satisfazer gostos (caprichos, interesses) pessoais. São públicas as mudanças (re)queridas, espelhadas e criticadas, sobretudo nas redes sociais. O Sínodo – pelos sinais e modos já evidentes – arrisca-se a embarcar na mesma onda: falar para fora, apontar para os outros.

A renovação “católica” (conversão?) só faz sentido se abraçada por todos os batizados, leigos e clero. Caso contrário, não passará de mais uma farsa (encenação), sempre usada como pedra de arremesso se querida/exigida só por uns ou só para uns. Há muito clero a precisar de “eminentíssima reforma”? Sim. Precisa a maioria dos leigos de urgentíssima mudança? Sim. Enquanto persistir a falácia de pensar e falar sempre para o outro lado da barricada não há renovação ou Sínodo que nos valha. Tem de começar pelos padres e bispos? Por que razão não podem os leigos “obrigá-los” à mudança através do seu compromisso sério e testemunho audaz? “Se a montanha não vai a Maomé, vai Maomé à montanha”…

A catequese continua a ser para a maioria dos encarregados de educação e catequizandos uma “escola/escala de sacramentos”: levar os filhos à catequese para fazer a primeira comunhão ou a comunhão solene e obrigá-los a continuar até ao 10º ano para fazer o Crisma, senão “não podem ser padrinhos”.

Quando procuram os catequistas não é (tanto) para conversar sobre o crescimento espiritual e humano dos seus, dialogar sobre o seu crescimento (maturidade humana e espiritual) e a sua condição de discípulos/cristãos (seguidores/imitadores de Cristo), mas para saber a data da festa (“temos de mandar convites”) e como deve ser (roupa, lugar, intervenientes). Passado o dia, passou a romaria: fezadas e festinhas.

Estes pais – primeiros educadores dos filhos – são os primeiros a reclamar e a fazer a vida negra aos catequistas se o horário ou o lugar da catequese não lhes convém: “não temos tempo”, “não vamos andar sempre a correr para a igreja”, “no meu tempo não era assim”, “quem me paga o gasóleo?”. Os mesmos pais que, pródigos de (in)coerência, não regateiam esforços e fazem semanalmente dezenas de quilómetros para levarem os filhos ao futebol, à música ou, pasme-se, à discoteca, aniversários dos amigos e convívios de várias ordens…

Estes pais – primeiros educadores dos filhos – exigem uma mudança na Igreja, mas não querem participar na Eucaristia dominical (mesa/refeição da família cristã) e levar os filhos consigo: “não posso obrigá-lo”; “ao fim de semana precisa descansar”; “aproveito para dar um passeio com eles”; “vão quando lhes apetecer”; “a Missa é para as beatas”.


Estes pais que seriam, porventura, bons educadores pelo exemplo e verdade, não têm problemas em mentir ao padre e aos catequistas (ou arranjar desculpas falsas) afiançadas e assinadas, sem pejo, pelos próprios filhos. A verdade usa-se como adereço, a pôr de parte quando não serve ou não dá jeito aos interesses próprios.

Estes pais – primeiros educadores dos filhos – reivindicam mudança, mas não têm tempo (vontade, disponibilidade, generosidade) para colaborar como catequistas, leitores, coralistas, visitadores ou membros de grupos de formação e evangelização. No entanto, são os mesmos que semanalmente levam o/a menino/a ao futebol (“ronaldite” aguda e sistémica) e ficam por lá horas a fio a pressionar e insultar treinadores, árbitros, colegas, entre outros.

Estes pais – primeiros educadores dos filhos – sem tempo/vontade para colaborar na catequese ou qualquer “serviço paroquial”, não se coíbem de exigir a catequese para os filhos, à hora e dia que lhes convém, fazendo dos catequistas escravos dos seus interesses e caprichos, esquecendo (talvez por míngua de caridade e/ou educação/respeito) que a maioria deles são pais e mães, têm emprego e encargos familiares e ainda têm de gramar com exigências e malcriadez de quem não contribui absolutamente para nada.

Em vez de bramir por mudança nos outros, não seria oportuno pensar em mudança pessoal? Converte-te a ti mesmo para que os outros acreditem em ti! Não seria evangélico arrastar os outros pelo exemplo e sinais claros de mudança pessoal e familiar? Se a sabedoria do povo diz (e bem) que “pimenta no rabo dos outros é refresco”, Ghandi também pedia para “sermos a mudança que queremos ver no mundo”. Da minha parte, tenho pensado e cada vez levado mais a sério: “quem não estiver bem que se mude”… Ou seria evangélico mudar (adulterar ou onerar a minha consciência/fidelidade) para agradar a interesses meramente pessoais e alinhar em trejeitos puramente mundanos?

P. António Magalhães Sousa, aqui