terça-feira, 29 de maio de 2007

Cem portugueses trabalham "como escravos" na Islândia

Até há pouco tempo, os relatos de "trabalho escravo" chegavam-nos de países distantes, da Ásia, de África, ou da América do Sul. Hoje, não só têm lugar na próspera e civilizada Europa, como a exploração da mão--de-obra emigrante atinge cada vez mais portugueses.

Os últimos exemplos têm a Islândia como pano de fundo e cerca de cem trabalhadores portugueses."É uma experiência muito má, parece que nos tratam como escravos", desabafou um trabalhador português , recentemente regressado da Islândia. Aquele trabalhador, que pediu o anonimato, foi contratado por uma empresa de trabalho temporário para participar na escavação de túneis, destinados a recolher a água proveniente do degelo dos glaciares e a transportá-la para uma barragem para produzir energia eléctrica."


"Trabalhamos dentro dos túneis todo o dia, em jornadas de 14 horas, com água até aos joelhos", diz aquele trabalhador, que aponta ainda a inexistência de condições mínimas: "até na mesa das refeições cai água constantemente". A alimentação é outra fonte de problemas: "a comida é horrível", diz o mesmo emigrante. O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil do Norte, Albano Ribeiro, adianta que as refeições são sempre feitas de arroz e cozinhadas pelos outros trabalhadores chineses, sendo que os operários são obrigados a comer num período de tempo muito curto, sempre dentro do túnel, sábados, domingos e feriados.

Segundo o DN apurou, em causa está a construção da central hidroeléctrica de Kárahnjúkar, na zona noroeste da Islândia, um megaprojecto adjudicado à multinacional de origem norte-americana, Alcoa, e iniciado em 2003.

Um jornalista do jornal islandês Morgunbladid confirmou ao DN que "têm existido incidentes relacionados com as condições de trabalho nesse projecto", adiantando que o Governo islandês anunciou a intenção de tomar iniciativas para regular as condições em que essa mão-de-obra é contratada.

Através do mecanismo de subcontratação de pessoal, com recurso a empresas de trabalho temporário, as grandes empresas conseguem reduzir os custos - buscando a mão--de-obra mais barata no mercado internacional - e limpar a imagem, quando há denúncias sobre desrespeito pela legislação laboral.

De acordo com o dirigente sindical que denunciou o caso, os portugueses têm como companheiros chineses, polacos e italianos, sendo que estes últimos ganham, em média, mais três mil euros por mês do que os portugueses que executam o mesmo trabalho.

Esta denúncia surge na mesma semana em que o DN deu conta de um caso parecido registado em Andorra, Espanha, com trabalhadores da construção civil. Foram dirigentes sindicais de Andorra que pediram à CGTP para que esta realizasse uma acção pedagógica para sensibilizar os trabalhadores portugueses que aceitam trabalhar em condições desumanas a qualquer preço.


A mão-de-obra portuguesa menos qualificada - confrontada com uma taxa de desemprego de 8,4% no último trimestre e com a concorrência de mão-de-obra imigrante mais barata - tenta agora a sua sorte na União Europeia. A Espanha, a Inglaterra, a Holanda e a Alemanha são, por ordem decrescente, os destinos preferidos. Estima-se que mais de 20 mil portugueses estejam a abandonar o País todos os anos em busca de trabalho.

Jornal de Notícias (DN), 27-5-07

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