domingo, 15 de fevereiro de 2009

Direito Canónico?

"Se Cristo nos libertou, foi para sermos realmente livres." - São Paulo
"Ama e faz aquilo que quiseres." - Santo Agostinho.

Sou ainda de um tempo em que se pregava muito mais o Direito Canónico do que a Palavra de Deus (isto de ser kota tem os seus inconvenientes, mas também as suas vantagens).
Penso ao contrário. Quanto mais Palavra de Deus, menos necessário se torna o Direito Canónico. É que Direito Canónico cheira-me a diplomacia - e o Vaticano é verdadeiramente reconhecido como umas das melhores escolas de diplomacia. Mas não poderá ser a diplomacia o secar da profecia? Segundo o Evangelho, terá sido Jesus Cristo um diplomata no sentido actual do termo?
O Direito Canónico cheira-me a imposições, restrições, limitações, sanções. E estas só a caridade as baliza.
Numa Igreja, casa da comunhão, a verdadeira lei é o Mistério Pascal de Cristo do Qual brota toda a graça e todo o projecto de vida para quem n'Ele acredita. Quanto mais espaço à Igreja-comunhão, menos espaço fica para o Direito Canónico.
O vínculo da caridade é muito mais exigente do que qualquer lei positiva. Então não nos dispersemos do essencial.

3 comentários:

  1. Sobre este assunto, vale a pena ler quanto escreveu o Papa João Paulo II:

    «Outra questão que emerge é sobre a natureza do Código de Direito Canônico. Para responder devidamente a ela, cumpre recordar o antigo patrimônio de direito contido nos livros do Antigo e do Novo Testamento, de onde, como de fonte primária, emana toda a tradição jurídico-legislativa da Igreja.

    Cristo Senhor, com efeito, de modo algum destruiu, mas, antes, deu pleno cumprimento (cf. Mt 5,17) à riquíssima herança da Lei e dos Profetas, formada paulatinamente pela história e experiência do Povo de Deus no Antigo Testamento. Dessa forma, ela se incorporou, de modo novo e mais elevado, a herança do Novo Testamento. Embora São Paulo, ao falar sobre o mistério pascal, ensine que a justificação não se realiza pelas obras da lei, mas por meio da fé (cf. Rom 3,28; cf. Gal 2,16), não exclui, contudo, a obrigatoriedade do Decálogo (cf. Rom 13, 8-10; cf. Gál 5, 13-25; 6,2), nem nega a importância da disciplina na Igreja de Deus (cf. 1 Cor 5-6). Os escritos do Novo Testamento permitem-nos, assim, perceber mais claramente essa importância da disciplina e entender melhor os laços que a ligam mais estreitamente à índole salvífica da própria Boa Nova do Evangelho.

    Torna-se bem claro, pois, que o objetivo do Código não é, de forma alguma, substituir, na vida da Igreja ou dos fiéis, a fé, a graça, os carismas, nem muito menos a caridade. Pelo contrário, sua finalidade é, antes, criar na sociedade eclesial uma ordem que, dando a primazia ao amor, à graça e aos carismas, facilite ao mesmo tempo seu desenvolvimento orgânico na vida, seja da sociedade eclesial, seja de cada um de seus membros.»

    João Paulo II, in Sacrae disciplinae legis, 1983.01.25

    O texto completo pode encontrar-se aqui: http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/apost_constitutions/documents/hf_jp-ii_apc_25011983_sacrae-disciplinae-leges_po.html

    Entre a caridade e a lei não há qualquer oposição. Como também não há qualquer oposição entre a pastoral e o direito.

    Sem qualquer dúvida, a caridade é o mais importante. E o cumprimento da lei é isso mesmo: o cumprimento da caridade dentro da justiça. A caridade, para ser verdadeira, nunca pode ser injusta.

    Um abraço fraterno
    Pe. José Alfredo

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  2. estou espantado! devo ser kota!

    desde que um padre terminou uma conversa num café dizendo que nunca leu a Bíblia toda, não precisava de conhecer o Direito Canónico e do Concílio Vaticano II só conhecia o que lhe interessava...

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  3. Graças a Deus fui aluno de bons mestres, embora não saiba tudo o que deveria ter aprendido com eles. A eles a minha homenagem!
    Quanto ao assunto em causa, penso que se deve dar o lugar devido a cada um dos instrumentos que enformam o homem de Deus e geram a comunidade solidamente encastelada, com vista à acção e ao crescimento. Recordo que o Venerando AAA, ao listar os denominados lugares teológicos, referia a Sagrada Escritura, a Tradição, o Magistério Ordinário, o Magistério Extraordinário, a Liturgia, o Código de Direito Canónico, etc. E, quando se referia ao Código de Direito Canónico como lugar teológico, dizia: "Esse desgraçado de quem toda a gente diz mal também é um lugar teológico".
    Não competindo ao Direito Canónico substituir-se ou sobrepor-se à Sagrada Escritura - que, interpretada, actualizada e vivida pela Tradição Eclesial, é a fonte divina da espiritualidade e do devir comunitário - ou à Sagrada Liturgia, mormente a Eucarística - alimento, espelho e cume da vida cristã - o Código de Direito Canónico tem um papel relevante enquanto regulador da valorização das pessoas e da coisas, da relação entre as pessoas, da concretização dos deveres e direitos de cada um, da identidarização das pessoas e das comunidades, enquanto instrumento do discernimento e guia da equanimidade moral.
    Não se pode, contudo, deixar de respeitar a hierarquia das coisas, em que, em primeiro, vem a Escritura. Porém, o Código, sem lhe competir definir conceitos ou criar doutrina, pode muito bem funcionar como espelho da doutrina acessível a todos e ser a expressão de uma grandíssima comunidade viva e madura.
    Graças ao Código não se poderá dizer alguma vez da Igreja o que Fernando Pessoa dizia de Portugal “nem rei nem lei, nem paz nem guerra, define com perfil e ser este fulgor baço da terra”; ou “ninguém sabe que coisa quer, ninguém conhece que alma tem, nem o que é mal nem o que é bem; tudo é incerto e derradeiro; tudo é disperso, nada é inteiro”.

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