Se dividirmos os rendimentos do trabalho pelo número de trabalhadores e compararmos o resultado com a média europeia, chegamos a um salário baixíssimo. Mas, se dividirmos a riqueza produzida pelo mesmo número de trabalhadores, a produtividade é ainda mais baixa. Eis uma equação que, parecendo tão simples, põe toda a gente em polvorosa: os trabalhadores, com razão, exigem salários melhores; as empresas argumentam que, para aquilo que produzem, eles já ganham de mais.
Mas uma coisa é o quanto se produz, outra coisa é a forma como essa produção se distribui. Se pensarmos na Suécia e dividirmos os rendimentos dos 20% mais bem pagos pelos rendimentos dos 20% mais mal pagos, chegamos a 3,3. A média da Zona Euro é de 4,7. Entre nós é de 8,2. Dos 27 países que hoje integram a União Europeia, Portugal é aquele que mais injustamente distribui a riqueza que obtém. Percebe-se o desencanto: viver em Portugal e ser pobre é de uma tristeza sem fim.
Depois, há o desemprego, hoje dos mais altos da Europa, onde cerca de metade é de longa duração. Há o limiar da pobreza, a que fechamos os olhos para não ver. E há a educação, o suporte de tudo o resto, com níveis de tal modo baixos que nos fazem corar de vergonha. Repare-se: 40% dos jovens entre os 18 e os 14 anos abandonam os estudos precocemente, quando este número não vai além de 5% em países como a República Checa, a Eslovénia e a Polónia. Como é que se sai disto?
Da má distribuição da riqueza pode sair-se de duas maneiras: através da fiscalidade e através dos salários. No primeiro caso, independentemente da carga fiscal global, é sempre possível substituir impostos indirectos, de aplicação uniforme, por impostos directos, de aplicação selectiva. No segundo caso, independentemente da massa salarial global, é sempre possível privilegiar o salário mínimo e aplicar a outros escalões taxas diferenciadas de crescimento. Falta organização e vontade política…
As outras questões são bem mais complexas. E têm na origem uma política erradíssima que nos persegue há séculos: a política de educação, causa primeira do insucesso escolar. Daí que, a par do esforço que está a ser feito a nível do ensino, sejam também necessários investimentos selectivos noutras áreas. Um exemplo recente pode servir-nos aqui de modelo: é a política seguida por Tony Blair, ao utilizar o investimento público para corrigir as desigualdades sociais do tempo da senhora Thatcher.
Quando defendi nesta coluna a não redução da carga fiscal, ao arrepio de uma corrente de sinal contrário que então começava a formar-se, era também este modelo que tinha em mente: a realização de investimentos selectivos, politicamente orientados e vincadamente sociais. E, para isso, mais do que controlar o défice, é imperioso reduzir a dívida, de modo a criar a almofada necessária para os financiar. O que inviabiliza nesta fase qualquer baixa de impostos.
Não tenhamos ilusões. Quando se trata do social, e das dotações que é necessário fazer, uma de duas: ou as faz o Estado, ou não as faz ninguém.
Daniel Amaral, http://expresso.clix.pt/COMUNIDADE/blogs/daniel_amaral/archive/2007/06/11/39912.aspx
Nota: Os sublinhados são da nossa responsabilidade.
Sem comentários:
Enviar um comentário
Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.