segunda-feira, 14 de abril de 2008

O mundo precisa de profetas como de pão para a boca

A compreensão da profecia bíblica hoje tende a rejeitar o lugar-comum que considera o profeta um adivinho do futuro, para vinculá-lo bem fortemente ao presente. Assim foi com os profetas de Israel, assim é com os profetas actuais. O fenómeno da profecia é feito de uma experiência de Deus, que impulsiona um ser humano a enfrentar todos os perigos, para comunicar uma mensagem divina. É, portanto, inseparável da consciência que tal mensageiro tem das características de seu tempo e de seu espaço.
Os profetas só podem ser entendidos quando a relação dinâmica entre eles e a sociedade onde vivem é plenamente compreendida e levada em conta. Assim, cada profeta é diferente, pois cada um responde a uma determinada situação na qual Deus o chama a abrir a boca e falar em Seu Nome. Por isso Gandhi não pode ser compreendido sem todo o contexto da dominação britânica sobre sua sofrida e amada Índia. Também Martin Luther King não pode ser conhecido fora do contexto da luta racial nos EUA e o apartheid criado pelo preconceito dos brancos. Ignácio Ellacuria e Pedro Casaldáliga não podem ser conhecidos em toda plenitude sem que se compreenda o contexto de pobreza e opressão em que vivem os povos latinoamericanos, que fizeram com que esses dois brilhantes sacerdotes - um filósofo e outro, poeta - deixassem sua Espanha natal oferecerem suas vidas pelo povo sulamericano.
Nos sombrios tempos em que vivemos, onde o medo parece ter-se apossado das mentes e corações e onde os acontecimentos em escala local, nacional e mundial nos fazem acordar diariamente perplexos, sentimos, mais que nunca, a carência de profetas. Sentimos a falta de homens e mulheres destemidos e que não conheçam o medo porque estão ancorados na vida e na promessa de seu Deus que jamais lhes falhou.
Necessitamos de profetas cuja língua de fogo possa ser ouvida e sentida com força suficiente, de forma a não permitir que o povo se acomode na mediocridade de uma vida que tem secretos compromissos com a iniquidade. Profetas que denunciem tudo o que vai contra a humanidade e a obriguem, por sua fala clara e transparente, a deixar de olhar apenas o seu próprio quintal e ver que consequências as suas decisões e actos poderão trazer para o mundo como um todo. Os profetas de ontem e de hoje são os únicos que podem ensinar-nos não haver outro caminho senão a total verdade e transparência na busca da vontade de Deus. Eles irão abrindo caminho para a conversão verdadeira: romper com o velho e abrir-se ao novo que vem e que é maior que nossos raquíticos planos, nossas pequenas e ínfimas guerras, nossos ridículos temores e egoísmos.
A violência que campeia nas cidades ... a saída de cena de muitos dos poucos líderes mundiais que restavam, como Yasser Arafat - tudo nos diz que carecemos de vozes outras, novas, que nos tirem de nós mesmos, de nosso pequeno mundinho e nos abra às necessidades que se encontram não apenas do outro lado da rua, mas do outro lado do mundo.
Pobre e desvalida humanidade, tão apavorada de perder o que tem e conseguiu acumular: bens perecíveis que o desgaste do tempo, a doença e a morte certamente lhe arrancarão. Pobre humanidade que não percebe que só criando pontes e estreitando laços poderá construir um mundo habitável para si mesma. Nunca insistindo em guerras sem sentido, que derramam sangue inocente e semeiam ódio e desejos de vingança.
Pobre humanidade, se tiver que continuar fazendo concessões sem cessar, compromissos inconfessáveis e conluios asquerosos para poder manter seus ilusórios privilégios.
Só os profetas poderão dar-nos algo de sua coragem, para que não recuemos diante do compromisso de abrir a boca e dizer a verdade, desbravando os caminhos da mentira e da corrupção, da injustiça e da violência, do terror e da iniquidade. Em suma, das velhas coisas que se recusam a deixar o campo livre para a vivência da justiça e do direito e o respeito pela vida.
E sobretudo, só os autênticos profetas poderão alertar-nos e clarear-nos para perceber aqueles que no mundo e na sociedade, actuam como falsos profetas. Esses abundam por todos os lados. Eis que é chegada a vez dos verdadeiros arautos da verdade. Deus, que sabe até que ponto os necessitamos, não deixará certamente de suscitá-los.
Maria Clara Lucchetti Bingemer

2 comentários:

  1. Caro Amigo! (permita-me que o trate assim, ainda que não saiba quem é, nem o Sr. saiba quem eu sou)

    Não tenho bom "feitio" e, além do mais, tenho o coração demasiado perto da boca (neste contexto, perto do dedos do teclado)!

    Sou Cristão, mas uma grande inquietação se tem instalado no meu ser!

    Uns comentários tracados em alguns blogs deixaram-me ainda mais inquieto!
    Lancei-me, então, de "link em link", em busca de qualquer coisa! Nem eu sabia de que!
    Cheguei, novamente aqui, depois de já cá ter estado e ... encontrei a PAZ, a serenidade e sinto-me mais tranquilo!

    Neste blog, hoje, encontrei o Amor de Deus!

    Bem-haja por me fazer sentir Cristo mais próximo!

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  2. Muito obrigado, amigo.
    Volte sempre.
    Muita paz n'Aquele que nos aquece o coração.
    Asas da Montanha

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