terça-feira, 17 de dezembro de 2024
segunda-feira, 16 de dezembro de 2024
Uma Igreja "a coçar pra dentro, a coçar pra dentro"....
A irrelevância política da Igreja
Os “temas” da Igreja estão fora da agenda política e ainda mais dos alinhamentos mediáticos. E, a avaliar pelo correr das águas, dificilmente voltarão a fazer deles parte.
A avaliar pelo que se assistiu nos debates televisivos que marcaram a pré-campanha das próximas Legislativas - e assistimos muito tempo e fomos muitos milhares de espectadores - a Igreja portuguesa tornou-se uma irrelevância política. Nem ela, nem os valores que defende, marcaram presença na longa maratona de esclarecimento para as eleições que se aproximam. Sinais dos tempos? Ou de uma Igreja que se condena e se conforma em falar apenas para dentro, resistindo a tomar parte no mundo em que vive e onde quer atuar?
E houve, seguramente, muitas oportunidades nas perto de dezassete horas de discussão entre os líderes políticos que concorrem a estas eleições. Os debates escorregaram nas horas, encheram noites televisivas com uma avalanche de comentários pós-programa mas, na verdade, só uma vez – uma vez apenas, sublinhe-se - a Igreja foi chamada a antena. E, apenas e só, quando a moderadora da SIC Notícias interpelou o candidato do Chega sobre a sua “fé e devoção ao cristianismo” e o aparente “desalinhamento em relação ao que André pensa e o que a Igreja defende” em matéria de imigração. Foi no dia 6 de fevereiro, no debate com o líder da Iniciativa Liberal e o assunto foi arrumado em segundos e chutado para canto.
Podia ser só uma falta de comparência, explicável num mundo cada vez mais laico, numa sociedade cada vez mais distante de filiações religiosas e onde o princípio de “a César o que é de César” é confortável para todos, Igreja incluída.
Mas, o problema é mais vasto do que isso. Não foi só a Igreja a estar ausente. Também todos os temas que são caros aos católicos faltaram à chamada dos debates televisivos: nem uma palavra sobre a pobreza, as desigualdades, a paz, a inclusão ou sobre qualquer forma de desrespeito pela dignidade da pessoa. Nem uma palavra, repito. Porque os “temas” da Igreja estão fora da agenda política e ainda mais dos alinhamentos mediáticos. E, a avaliar pelo correr das águas, dificilmente voltarão a fazer deles parte.
Só que este silêncio, infelizmente, não significa que está tudo bem. Basta lembrar dois dos temas centrais – a paz e a pobreza – para recordar o quanto o mundo enfrenta uma guerra em várias frentes e o quanto, em Portugal, a miséria ganha foros de uma tragédia silenciada. Meio milhão de portugueses vivem numa condição “severa de privação material e social”, diz a Cáritas, num relatório recente, que mostra como as estatísticas se mantêm inalteradas ao longo dos últimos anos, apesar de todas as promessas, boas intenções e vontade de mudança.
A política e os media arredaram a Igreja das suas agendas, mas isso não é, nem uma condenação eterna, nem uma inevitabilidade das sociedades modernas. O próprio Papa Francisco incentiva os católicos, leigos ou sacerdotes, a uma intervenção política direta. “Embora a Igreja respeite a autonomia da política, não relega a sua própria missão para a esfera do privado”, disse o Papa na Fratelli Tutti. A Igreja “não pode nem deve ficar à margem na construção de um mundo melhor”, nem os seus ministros “podem renunciar à dimensão política da existência que implica uma atenção constante ao bem comum e a preocupação pelo desenvolvimento humano integral”, diz o Papa.
Mas, por cá, há poucos sinais desse espírito missionário. É certo que os bispos do Porto e de Setúbal participaram em manifestações, ora de polícias, ora de médicos, dando voz e solidariedade à defesa dos seus direitos. É verdade que em muitas dioceses foi feito o apelo ao voto e à participação eleitoral. Mas há um longo caminho a fazer. “As decisões políticas do dia a dia não podem ser alheias àquilo que é a nossa sensibilidade e a nossa leitura católica ou de outra religião”, disse D. Américo Aguiar em entrevista recente à RTP3. O problema é que são. E temo que assim continuarão a ser.
Rosa Pedroso Lima
- Basta ver a ordem de trabalhos de tantas reuniões de organismos católicos por essas dioceses fora. Os assuntos são esmagadoramente - se não totalmente - voltados para dentro, para o foro interno. Conselhos pastorais diocesanos, conselhos de presbíteros, conselhos de arciprestes, reuniões de movimentos e grupos, encontros de formação para padres, intervenções dos bispos, reuniões da CEP, etc, etc.
A Igreja só crescente quando se volta para fora; voltada para dentro, torna-se autofágica. Não é que Cristo insiste e persiste na orientação: "Ide, eu vos envio...."?
domingo, 15 de dezembro de 2024
NATAL DE FACHADA E DAS FACHADAS
Gosto de olhar os pormenores. Também nesta quadra de Natal. Continuo a acreditar que o seu centro (causa primeira) seja celebrar o nascimento de Jesus, o Salvador e preparar a Sua vinda gloriosa. Caso contrário, seria mais um feriado, como o Carnaval, o 25 de abril, o 1º de maio ou os santos populares, cada um com as suas motivações, adereços e encenações.
quarta-feira, 11 de dezembro de 2024
RAZÕES QUE AFASTAM DA IGREJA A MAIORIA DE FIÉIS E PADRES
Um sacerdote alemão fez uma lista de algumas coisas que não funcionam na Igreja: «Depois de 30 ANOS de serviço, deixo a minha atividade como pároco e o meu serviço ativo na diocese de Münster. Pedi a demissão e abandonei o campo que configurou, durante décadas, os meus dias, a minha vida, a minha pessoa». O padre Thomas Frings foi pároco da cidade de Münster, Alemanha. Agora, decidiu deixar a paróquia e passar um tempo de reflexão num mosteiro. Está desanimado pelo que considera um “esforço inútil” de uma “pastoral esclerosada e inadequada”.
Entretanto, fez uma lista de coisas que não funcionam na Igreja alemã, mas que podem referir-se a qualquer outra Igreja do mundo. São problemas que afastam as pessoas e enfraquecem a instituição eclesiástica (também muitos dos seus padres), deixando-a estranha aos olhos de muitas pessoas:
1- POUCAS VOCAÇÕES, MUITA CONFUSÃO
Segundo Thomas Frings, uma das figuras que gera mais desconfiança é a do seminarista. Ser sacerdote parece o mesmo que pertencer a uma empresa complicada, quase titânica. Seja pelos vínculos tão duros, como o celibato e a promessa de obediência, seja porque não é fácil definir o próprio futuro num contexto em que há falta de sacerdotes e de fé. «Em 1980, comecei a estudar Teologia. Em Münster, éramos 40 seminaristas naquele semestre. Éramos somente a metade em relação a 25 anos atrás. Mas as perspetivas eram boas: 3 postos de capelão em 4 anos, depois pároco. Nas estruturas da época, era algo factível. Quem começa hoje a estudar Teologia, provavelmente já não encontrará esse caminho. Há 30 anos, a estima por esta vocação ainda era muito alta. Não se escolhia ser padre por isso – ao menos normalmente. Mas a perda de consideração certamente não ajuda a estar motivado para isso. (…) Não somos uma empresa. Mas alguém aconselharia um jovem a fazer parte de uma companhia com estas perspetivas e com celibato e promessa de obediência?», pergunta o padre.
2- DISCUSSÕES INFÉRTEIS NOS CONSELHOS PAROQUIAIS
Outro erro que deixa a Igreja pouco atrativa são as discussões que frequentemente se repetem nos órgãos paroquiais. «Que impressão teria um não crente ou uma pessoa de outra religião que participasse das discussões dos conselhos paroquiais, em que são negociados os lugares e horários das nossas celebrações? Quando se negocia meia hora antes ou mais tarde para que dê tempo de fazermos o trabalho no jardim, dormir até mais tarde ou assistir a uma partida de futebol? Quando se falam de costumes e comidas, ao invés de discutir o significado da morte e ressurreição de Jesus? (…) Como podem brotar da Missa a luz e a alegria, esperança e convicção, quando ela já não é tão importante quanto um café da manhã mais tarde ou um jogo entre o Colonia e o Bayern de Munich?», pergunta-se o padre.
3- MUDAR SIM, MAS SEM FERIR SENTIMENTOS
»Às vezes, participo de celebrações litúrgicas e, ao final delas, me pergunto se eu continuaria indo àquela igreja. Ao final da Missa, me sinto verdadeiramente ‘despedido’, no sentido literal da palavra. Às vezes, mesmo como fiel, saio da celebração eucarística e não sei se deveria sentir-me zangado, triste ou até afetado. Nem sempre isso depende do celebrante ou da homilia; geralmente depende do quadro em seu conjunto. Se, por exemplo, querem mudar os costumes e tradições, antes de fazer isso é preciso levar em conta a sensibilidade dos fiéis. (…) Um companheiro contou, visivelmente emocionado, que lhe fizeram uma amável advertência depois de sua primeira Missa na paróquia. Um homem aproximou-se dele e disse: ‘Padre, na nossa paróquia é preciso distribuir a comunhão mais devagar. Nós levamos muito tempo para comungar’. A advertência e a sua formulação diziam muito da atmosfera que reinava na celebração eucarística e na relação existente entre as pessoas da comunidade. Além disso, aquela advertência caiu num terreno disposto a recebê-la», esclarece o Padre Thomas.
4- A PROMESSA BATISMAL NÃO CUMPRIDA
“Prometemos educar o nosso filho na fé”. Quem já participou de um batizado conhece esta frase. E muitos já a pronunciaram, de forma mais ou menos consciente. Hoje, a crise da fé, sobretudo entre os mais jovens, deve-se muito à distância das famílias em relação à Igreja, que se recuaram da promessa feita no batismo.
«Encontrei-me, certa vez, com um casal que tinha deixado a Igreja e queria batizar o filho somente para que ele pudesse frequentar, depois, uma escola diocesana. Eu não batizei a criança. Mas os pais encontraram outro padre que, talvez, tenha tido outras boas razões para fazer o batismo», lamenta o padre. O sacerdote pensa que uma solução poderia ser a “introdução de um catecumenato mais longo” para pais, padrinhos e madrinhas dos batizandos. «Seria, provavelmente, um caminho, mas só funcionará se todas as paróquias seguirem-no».
5- PRIMEIRA COMUNHÃO? UM SHOW!
Sobre os problemas da cerimónia da Primeira Comunhão, Padre Thomas é duro. Hoje, é cada vez mais difícil transmitir às crianças a importância do primeiro “encontro” com o corpo de Cristo. «Reina em todas as partes um grande nervosismo. O salão é arejado, limpo e enfeitado. Os bancos são reservados e o programa com o desenvolvimento da cerimónia é impresso. Vários ornamentos são colocados no caminho da entrada e na fachada da igreja. Depois, chegam eles, os pequenos protagonistas, por quem se gastam tanto tempo e dinheiro. Eles vão vestidos como se fossem a um antigo e prestigioso Gran Hotel, com roupas e adornos de pequenos adultos», diz.
À luz dessas experiências, o Padre Thomas propõe outro modelo de preparação para a comunhão: numa hora as crianças receberiam a explicação sobre a celebração eucarística, noutro momento ensaiariam a celebração e, no domingo, elas já participariam da celebração. No final, todos seriam convidados a seguir a catequese como preparação posterior (não anterior, como acontece hoje), em forma de grupos, com reuniões e participação na Eucaristia do domingo.
6- COMPREENSÃO E AJUDA AOS CASAIS
O casamento pode ser o momento em que os noivos voltam a encontrar a fé. E para que comecem a viver uma nova vida cristã depois de um período de distanciamento espiritual. Mas os padres, geralmente, não dão aos noivos a oportunidade de conhecer a fundo o valor do que eles vão celebrar. Para fazer isso, é preciso compreender a história dos que vão receber o sacramento. «Um dia, veio até mim um jovem casal que havia redescoberto a fé. Eles me contaram isso e também disseram que os membros das suas famílias poderiam participar do casamento, mas não de uma celebração eucarística. Para o casal, era muito importante que a Comunhão fosse dada a todos, mas os seus convidados não saberiam o que fazer com ela. No entanto, eles não queriam renunciar à Eucaristia. Por outro lado, não poderiam excluir o resto da família da celebração. A solução foi simples. O matrimónio foi celebrado com a Liturgia da Palavra e, depois, os recém-casados receberam a comunhão numa Missa, mais tarde», exemplificou o autor.
7- MAU EXEMPLO
O mau exemplo que os responsáveis pelas instituições dão no que diz respeito ao estilo de vida e à ostentação afastam as pessoas da Igreja. Escreve o Padre Thomas: «antes de administrar o sacramento da confirmação, um bispo quis dialogar em tom amistoso com os confirmandos. Ele pediu para que os crismandos perguntassem tudo o que eles queriam saber sobre um bispo. Ele lhes disse: ‘Sou um de vocês, podem perguntar tudo’. Então, um deles respondeu: ‘Senhor bispo, enquanto o senhor se vestir assim e andar nesse carro com motorista, o senhor não será um de nós’».
8- UM VERDADEIRO “CENTRO DE SERVIÇOS” PARA OS FIÉIS E PARA OS DEMAIS
«Se eu vejo a igreja como algo que tenho na minha frente, então posso desejar algo dela, exatamente como o cliente num restaurante, onde ele é rei», explica o padre alemão. «Pode-se argumentar que, na Igreja, fala-se com amor às pessoas e que elas não podem vir com exigências. Efetivamente, isso não deveria acontecer nunca em relação aos sacramentos, mas entre os dois extremos – o pedido e a exigência – há um caminho longo. E quem se aproxima deveria ser bem-vindo», conclui Thomas Frings.