AS DIABRURAS DO TOI
Toi. Só está bem a pregá-las. Claro que às vezes saem-lhe caras, se saem!...
Naquela manhã soalheira de Inverno, D. Pureza, com a bacia da roupa debaixo do braço, dirigiu-se ao estendal. Esticou os lençóis, toalhas e demais roupa. Entretanto Toi, sentado no chão, observava atentamente a dona. O cordel vazio por cima do estendedoiro, moilha-lhe a cabeça. Era cá um impulso para trepar pelo pau acima e fazer acrobacias no fio!
D. Pureza debanda e o bicho, matreiro e
sabidão, acompanhou-a, ronceiro. Mal a patroa desapareceu porta
dentro, ó pernas para que te quero!... Corrida doida para o estendal. Subiu ao cordel e, qual artista de circo, fez, durante largo tempo, todo o tipo de acrobacias. Até que um descuido o fez
espanejar-se estrondosamente num lençol que ficou
encotinhado, sujo e com as marcas
indisfarçáveis do seu pelo castanho e branco. Aflito, deu às de vila
diogo e foi especar-se no telhado.
A meio da manhã, D. Pureza pegou no
regadorzito e foi borrifar a roupa.
Toi saltou do telhado e acompanhou-a, caminhando à frente, rabo no ar, como se nada tivesse a ver com o que se passara no estendal.
Ao
deparar-se com o estado em que se encontrava o seu melhor lençol, D. Pureza passou-se dos carretos. As marcas do mafarrico do gato eram
claríssimas. Vira-se, vem cá trás com a mão e explodem dois valentes
estoiros no cerro cilíndrico do
Toi, daqueles cujo eco se prolonga até Coimbra. Atordoado, meteu a sexta velocidade e foi curar os
ardumes para cima da rede do poleiro.
Não demorou muito tempo a pensar noutra. Mal passaram as ardências, começou a provocar a galinha pedrês que se esganiçava toda, correndo para aqui e para ali como
dubadoira em volta dos filhotes. Tanto saltou, tanto cambalhotou que a rede da cobertura cedeu e caiu com estrondo no galinheiro. A pedrês pegou num cacarejar histérico, continuado, aflitivo. Parecia que lhe estavam a arrancar os fígados!
D. Pureza, que varria a casa, a
pareceu desassossegada à porta com a vassoura na mão. Passou-se de vez. Abriu o
portilhol do galinheiro e, logo que o
Toi se ia a esgueirar,
caíram-lhe na lombada três vassouradas daquelas que fazer miar um hipopótamo.
Com o cerro em labaredas, fugiu para a
cardenha onde se aninhou no meio do feno. Que pontadas! Até se lhe secava a boca e nem um miau conseguia soltar. Cansado de estar
encotinhado, tentou erguer-se. Mas mal esticou as patas para se espreguiçar, parecia-lhe que os ossos rangiam. Uma dores! Então voltou a enovelar-se e mandou a fome às
malvas. Jurou a si mesmo que iria ter
juízo, pois o corpo não aguentava mais pagar as palermices da cabeça.
Três dias depois, aparece.
Esgalgo, faminto, de vista turva. A dona viu-o, chamou-o e deu-lhe uma sardinha
lombuda toda para ele. Consolou-se.
O cão
Termudes não sentia qualquer afeição por ele. Mal o via, entrava numa
ladradeira medonha, esticando-se todo a ver se lhe conseguia chegar. Valia o forte cadeado e a robustez do tronco da mimosa a que estava preso.
Naquela tarde,
Termudes dormia a solto solto na
casota e Toi aproveitou para se empoleirar no cima do atarracado tronco da mimosa, de onde se pôs a miar
desafiantemente.
O quê!? Podia lá ser! Aquele
mini-cilindro ali, no coração do seu território!? Era uma fúria viva, todo eriçado, com a dentola à mostra. Embora mastodonte, por mais que se esticasse, não
conseguia chegar ao local onde estava o gato. E, quando se esticou mais, recebeu um par de
arrebunhadelas, daquelas de fazer gritar uma pedra.
Completamente perdido, sem consciência do perigo,
Bermudes esticou-se ainda mais e, numa das arremetidas, consegue agarrar o bichano por um quadril. Foi o lindo! Arrastou-o para o chão, pôs-lhe as
patolas em cima, prendeu-lhe o rabo entre os dentes e há que o fazer girar no ar a uma velocidade superior à de uma nave espacial.
Toi pensou que era o fim.
Caiu com estrondo na borda do tanque, deslizando a seguir para dentro da água.
Saiu a custo, encharcado,
dorido, esfarrapado. Ainda conseguiu olhar para
trás e ficou mais sossegado ao ver que o rabo escapara ileso aos dentes do
Termudes. Arrastou-se para o quentinho da boca da mina, onde se recuperou durante uns longos e sofridos oito dias.
Qual será a próxima,
Toi?