quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

Sobre o papel social da escola…

Apesar do quase silêncio de alguma comunicação social de referência, a greve dos professores de 3 de Dezembro teve uma adesão elevadíssima. Porém, alguns Conselhos Executivos e auxiliares de acção educativa mantiveram muitas das escolas em funcionamento, “abertas”.
Ora um departamento governamental que, a meio de uma greve com esta dimensão, divulga lhanamente que há muitas escolas abertas, só pode estar a gozar, ou a meter a cabeça na areia, à laia da avestruz. Ou então quem manda já não está tem condições para o decente exercício do poder.
Se foi verdade que a Ministra da Educação tinha pressionado os Conselhos Executivos para manterem as escolas abertas, impõe-se uma conclusão: as escolas não precisam de professores; precisam apenas de Conselhos Executivos para mandar nos funcionários, funcionários para abrir ou fechar os portões e para manter a cantina a funcionar e burocratas para inflacionar as notas; e, sem professores, a escola pode finalmente desempenhar um seu diminuto papel social – manter os miúdos ocupados num local seguro, enquanto os pais vão trabalhar. Há quem sugira que os professores podem estar de greve, mas existem sempre os livros, os computadores, os recreios... Os professores até estão reduzidos, algumas das vezes, a catalogadores das competências dos estudantes ou, se formos mais generosos, a dinamizadores do saber! E a escola como palco privilegiado de educação, formação, qualificação, cultura… vai sendo remetida para as calendas gregas!
Estamos no bom caminho dessa realidade, escolas transmutadas em depósitos de alunos, para os pais poderem descansar da sua esgotante presença. Lá dentro basta deixar-lhes benevolamente o uso do telemóvel, permitir-lhes generosamente o MP3 e os auscultadores, tolerar-lhes prazenteiramente o palavrão e dar-lhes portáteis que abundem, com a necessária banda larga, que eles logo vão querer alistar-se no partido dominante.
É verdade que para as pessoas que trabalham é difícil, se não impossível, levar os filhos para os empregos. Mas, como pode um pai ou mãe responsável ir deixar o filho na escola sabendo que não há aulas? Não será como levá-los a uma paragem de autocarros em dia de greve dos transportes?
Estão seguros na escola? Pode dizer-se que em dias normais os alunos estão tão seguros na escola como o estariam em casa. Em dia de greve de professores e/ou de funcionários, não, com certeza, já que não se sabe se vem a próxima aula ou a refeição, se pode o aluno entregar-se à próxima actividade lúdica. É a incerteza, a confusão. Mais seguros estão quando temos os alunos, professores e funcionários motivados, mobilizados e satisfeitos. Talvez não haja dias ideais, mas a batalha de todos os dias pela educação da infância, adolescência e juventude merece que se repense a escola, de modo que ela seja verdadeira oficina dos saberes e dos afectos e promotora da cultura humanística. É necessário que a escola disponha de tempos de aula e de tempos de apoio – disponíveis, eficazes e aceites pelos alunos e pelos encarregados de educação – de tal modo que se poupe, em circunstâncias normais, o tempo e o dinheiro gastos com os explicadores, pagos a peso de ouro para ensinar o que os professores podem e querem ensinar e ensinar bem.
Vários sistemas educativos da Europa (há quem diga “todos”), dispõem de um número equânime de professores com turmas e sem turmas. Compete aos professores sem turmas atribuídas, o trabalho individual ou em pequeno grupo com alunos que exponham dúvidas ou revelem dificuldades quer habituais quer episódicas. Em Portugal, isso, se existisse, seria um luxo a suprimir após a primeira curva da estrada do sistema. Preferimos a sobrecarga da classe docente sacrificada e pacífica!
Repense-se quanto antes, em debate público e franco, a função da escola. Não venha a suceder que, se, por azar da vida ou da organização social, económica e política, os pais não tiverem trabalho, haja a tentação de os meterem nas escolas, a frequentar a cantina e usar um Magalhães fornecido pela Cosa Nostra do Governo que temos ou viermos a ter.
Já agora, a talho de foice, quando é que podemos deixar de avaliar o Governo só através de uma cruzinha? Se o modelo que pretendem impor aos professores, é tão positivo, porque não entregar, no acto eleitoral, uma meia dúzia de fichas a cada eleitor para que todos e cada um se pronunciassem sobre aqueles campos todos, fazendo contas e ditando o veredicto final ministro a ministro, deputado a deputado? Os que não se dessem a esse trabalho, seriam objecto de processo disciplinar; os que não se sujeitassem a essa avaliação, não progrediriam na carreira.
Louro de Carvalho

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