Investigador lembra «constrangimentos» da Assembleia Constituinte e elogia papel da Igreja Católica
Manuel Braga da Cruz, investigador e antigo reitor da Universidade Católica Portuguesa (UCP), considera que a transição democrática portuguesa iniciada no 25 de Abril é “uma transição inacabada”.
“A nossa Constituição não é uma Constituição feita livremente pelos constituintes, há muitos aspetos que decorrem da natureza revolucionária da transição. Não creio que se possa dizer que esses constrangimentos sejam democráticos, pelo contrário”, sublinha, em entrevista à Agência ECCLESIA.
Para o especialista, é preciso lembrar que uma parte da Constituição ficou definida pelo acordo firmado entre militares e os principais partidos políticos.
O pacto Movimento das Forças Armadas/Partidos estabelecia que dois dos seis órgãos de soberania a criar pela futura Constituição ficariam nas mãos dos militares: o Conselho da Revolução e a Assembleia do MFA.
“O afastamento dos militares da vida política só aconteceu em 1986, com a eleição do primeiro civil para a Presidência da República, Mário Soares”, realça Manuel Braga da Cruz.
Para o investigador, existe a necessidade de uma revisão constitucional que seja capaz de “expurgar” a Constituição Portuguesa dos “resquícios da limitação da liberdade dos constituintes” que o pacto MFA/Partidos implicou.
O antigo reitor da UCP elogia, por outro lado, o papel “decisivo” da Igreja Católica no pós-revolução, assumindo uma posição de “moderação” e de “redireccionamento democrático” da transição.
“A Igreja teve um papel muito importante na transição democrática e depois na consolidação da democracia”, recorda.
Braga da Cruz entende que as posições dos bispos no pós-25 de Abril ajudaram a travar excessos e ameaças às liberdades que teriam colocado em risco a construção da democracia.
A convocação dos católicos para “manifestações de massa” levou a uma “intensa mobilização para defender as liberdades públicas”.
O especialista recorda que já em 1972, no 10.º aniversário da ‘Pacem in Terris’, a Conferência Episcopal Portuguesa fazia a defesa da “participação e do pluralismo político”, numa nota pastoral.
A Igreja pretendia assim uma “mudança tranquila” e uma “transição pacífica” para a Democracia.
O antigo reitor da UCP assinala também que os chamados três ‘D’ - descolonização, democratização e desenvolvimento - não eram estranhos ao pensamento católico.
“A Igreja tinha vindo a insistir muito nessas três direções e tomou iniciativas para as preservar, algumas delas muito incisivas”, precisa.
O especialista observa que a grandes mudanças que ocorreram dentro da Igreja Católica não foram “tanto depois do 25 de Abril, mas antes”, dado que o Concílio Vaticano II (1962-1965) veio operar uma “mudança muito significativa da cultura política e social da Igreja”.
Em Portugal, o 25 de Abril veio “permitir uma maior liberdade à própria Igreja”, com o fim de alguns condicionamentos à sua atividade e à sua vida interna, por parte do Estado, provocando ainda uma “reestruturação da forma organizativa” do laicado católico
A consagração das “liberdades públicas”, por sua vez, veio favorecer um “maior aprofundamento da liberdade religiosa” em Portugal.
In agência ecclesia
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