segunda-feira, 19 de julho de 2021

TAMBÉM É PRECISO «DEIXAR ANDAR»

1. «Deixar andar» é uma locução que não goza de boa reputação.
Aos nossos ouvidos inclementes, ela soa a passividade, a indiferença, a sensaboria, quiçá a conveniência e até a conivência.
2. De facto, quem «deixa andar» tende a demitir-se, a ausentar-se, a acomodar-se. Ou, então, limita-se a ver sem se envolver, optando — quando muito — por palpitar e depreciar.
Não será, contudo, possível extrair desta expressão um aroma inspirador e um sentido freático, a que porventura ainda não teremos acedido?
3. Não dirá o mais elementar bom senso que é tão respeitável «andar» como «deixar andar»?
Não é verdade que, frequentemente, colidimos com obstáculos que não nos «deixam andar»? Não será urgente «deixar andar» a vida, «deixar andar» o sonho e «deixar andar» os outros?
4. Também é preciso «deixar andar» o Espírito. Ou, melhor, torna-se cada vez mais imperioso estar atento ao (multiforme) «andar do Espírito».
Falta-nos muito este olhar e falhamos bastante neste cuidado. Com tanto afã em «andar», praticamente nem reparamos em como o Espírito «anda» e sopra.
5. Gastamos tempo e desgastamos energias indispensáveis para vivenciar o que o Espírito Santo não cessa de suscitar.
Leonardo Sapienza formula a pergunta decisiva: «Para que servem tantas iniciativas, tantos congressos, tantos livros se depois dedicamos pouca atenção ao “como” se vive aquilo que se prega?»
6. O nosso equívoco pode radicar aqui. «Andamos» a avolumar fórmulas (supostamente) criativas que quase cometemos a ousadia de não «deixar andar» o Espírito criador.
E é assim que, com tanta sofreguidão em «procurar novos estilos de vida, corremos o risco de negligenciar o testemunho da vida».
7. Empenhamo-nos em dizer como se deve viver, quando o importante é viver como se deve.
Daí que «as nossas palavras pareçam sedutoras, mas não convertem, porque talvez satisfaçam os ouvidos, mas sem penetrar o coração».
8. Se queremos que as igrejas se voltem a encher, anunciemos Jesus mais com a vida do que com as palavras. Pois o fundamental — alertava São Paulo VI — é «ver como se vive».
O problema é que nem sempre se vê e nem todos conseguem ver. É tudo tão apressado e ruidoso que não somos capazes de ver nem de escutar.
9. «Andamos» tanto (de lugar para lugar, de iniciativa em iniciativa) que mal «deixamos andar o Espírito».
É claro que o Espírito nunca deixa de «andar». Nós é que raramente nos apercebemos.
10. Não nos conformemos com celebrações apressadas e não nos aquietemos longe do Sacrário. A renovação da Igreja clama por mais oração, mais investigação e mais compromisso com os pobres.
«Deixemos andar o Espírito» e as surpresas serão incontáveis!
João António Teixeira, Facebook

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