Há umas décadas havia pouco conhecimento sobre a vida intra-uterina, pelo que era possível tentar justificar o aborto com esses desconhecimento. Mas hoje a biologia não deixa qualquer dúvida sobre o que acontece no útero da mulher: desde o primeiro instante há uma vida nova que se inicia. Apesar de se repetirem ad nauseam disparates como ser um amontoado de células (não somos todos?) ou que o bebé faz parte do corpo da mulher, a ciência não deixa margem para dúvidas sobre o facto de que aquele ser microscópico que a fecundação gera ser uma nova criatura pertencente à espécie humana.
O problema por isso não é de informação. Se assim fosse, a questão era fácil de resolver. Bastava apresentar os factos científicos. Mas o problema não é haver dúvida sobre o bebé por nascer ser um Ser Humano, mas que o nosso tempo considera que essa Vida Humana não tem valor. O drama do aborto não se resolve com manuais de biologia, mas com uma mudança de mentalidade.
Muitos se escandalizam quando se compara o flagelo do aborto ao Holocausto ou à escravatura. Mas a raiz do problema é igual. Uma sociedade que considera que a dignidade humana pode ser definida por ela. E que por isso a protecção legal à Vida Humana não depende do simples facto de existir, mas do reconhecimento pelo poder dessa protecção. E assim é Vida Humana, não aquilo que a biologia diz que é, mas aquilo que a maioria assim considera. Como para a maioria dos europeus e dos americanos os negros não eram humanos, como para a maioria dos alemães os judeus eram infra-humanos, para a maioria da sociedade ocidental a vida por nascer não é humana. Por ideologia ou mera conveniência.
Criou-se o mito de que o aborto era um direito da mulher e que a sua liberalização servia a sua libertação. E a defesa ideológica da liberdade feminina, tem servido de argumento para justificar a morte das crianças por nascer, como a posição do Presidente Biden sobre a lei do Texas que restringiu severamente o aborto, prova.
Talvez o mais infeliz desta cegueira ideológica é que se mate em nome de uma suposta liberdade, quando o aborto livre é um instrumento para oprimir a mulher. O aborto é hoje algo de banal para a sociedade em geral, excepto para a mulher que passa por essa violência. O aborto livre dá à sociedade uma solução “fácil” para um problema complexo. Uma rapariga menor de idade engravida para vergonha dos pais? Estes levam-na ao hospital e o problema resolve-se. A mulher pobre que espera um terceiro filho (a taxa de abortos a partir do segundo filho aumentam drasticamente) e vai precisar de apoio? O Estado oferece um aborto e o problema resolve-se. A funcionária que aparece com barriga quando tem contrato a prazo? O patrão diz que com um aborto o contrato é renovado e o problema resolve-se. O homem abusador engravida a companheira e não quer a criança? Ameaça-a com uma sova se não “resolver” o assunto e o problema resolve-se. Assim funciona o aborto “livre”, passa todo o peso da gravidez para a mulher, legalizando a opressão sobre a mulher para que esta se livre do seu filho antes de nascer
O aborto livre em nome das mulheres é uma cegueira ideológica do feminismo, que concede aos homens um poderoso instrumento para se desresponsabilizar dos seus actos. Conceber a criança exige o consentimento dos dois, mas ter a criança passa a ser da inteira responsabilidade da mulher.
E o flagelo do aborto continua a aumentar. Todos os anos milhões de crianças são mortas ainda no ventre da sua mãe. E a sociedade festeja e chama-lhe liberdade. Cegos pela sua própria soberba, de senhores da Vida. Espero por isso que venha o tempo em que se olhe para trás e se pergunte: como foi possível?
José Maria Seabra Duque, aqui
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