terça-feira, 5 de agosto de 2008

Em que lotaria jogamos?

Todos sabem que os portugueses são apaixonados pelo jogo: euromilhões, totoloto, totobola, lotaria, o bingo, a roleta … tudo isso está a levar boa parte dos sonhos e do dinheiro dos portugueses. As coisas andam mal, e uns mais e outros menos, todos acreditamos na mágica solução da “sorte grande” para sair de apuros.
Eu acho a lotaria estupenda, entendida como jogo. Quem não sonhou, na segunda quinzena de Dezembro, com todas as coisas bonitas que iria fazer com a sorte grande? Quem não sonhou já com as coisas maravilhosas que faria caso saísse o euromilhões?

O preocupante é o sonho convertido em febre, ou confundir a esperança com a sorte. Ou, o que é pior, mergulhar nas lotarias do dinheiro, e esquecer todas as demais lotarias com prémios muito mais suculentos e seguros.

A lotaria de viver, por exemplo. Saiu-nos a todos desde o dia em que a bola da existência caiu sobre nós. Viver bem é estupendo; mas eu acho ainda mais estupendo o simples facto de viver. No dia do nosso nascimento saiu-nos a “sorte grande”, saímos da pobreza absoluta do nada, entrámos na maravilha do tempo e do sangue. Absurdo é haver gente que gira pelo mundo sem se ter dado ao trabalho de consultar a lista dessa lotaria de viver, para verificar que está lá o seu nome.

A lotaria de amar é ainda mais fecunda, e tem prémio duplo: a possibilidade de amar e a de ser amado. Quem saberia dizer qual dos dois é o maior? Nesta lotaria nem é preciso comprar bilhete: basta ter coração, e não o deixar endurecer demasiado pelo egoísmo. É um sorteio com muitas pequenas alegrias que, além disso, saem em todos os números.

A lotaria da esperança é um pouco mais ladeira acima. Para jogar nela temos de ter os olhos limpos e alguns quilos de coragem perante a adversidade. Mas está também ao alcance de todos. Em geral esta lotaria não distribui prémios grandes; tem de ganhar-se cada dia, com pequenas aproximações que dão para continuar a comprar esperanças para o dia seguinte.

Vem depois a lotaria do acreditar. Acreditar, se for possível, em alguém. Ou, pelo menos, em algo que, se for límpido, leva a acreditar nesse Alguém, que eu escrevo com maiúscula. Esta lotaria não se compra.É um dom. Mas um dom oferecido a todo aquele que o busca com boa vontade. Essa é que é uma boa “sorte grande”. Não resolve os problemas. Mas dá força para os resolver.
Todas estas lotarias estão aí à disposição de toda a gente. E saem a todos os que jogam. Oferecem-se a ricos e pobres, mais aos pobres do que aos que se rebolam em riqueza.
O que espanta é que não haja filas nas agências de recolha.

2 comentários:

  1. Post fabuloso!
    Para reflectir nestes dias de férias e fazer durar ao longo do ano!
    Obrigada!

    ResponderEliminar
  2. Apareça sempre!
    Obrigado pelo apoio.
    Muita paz!

    ResponderEliminar

Nota: só um membro deste blogue pode publicar um comentário.