sexta-feira, 16 de setembro de 2022

Novos bispos para Angra, Bragança e Setúbal estão para breve

 Vinte por cento dos padres em todo o mundo estão a recusar ser nomeados para bispos. E em Portugal também já houve pelo menos três casos, nos últimos meses. Uma situação que pode ajudar a explicar o atraso na nomeação de novos bispos para Angra, Bragança e Setúbal – que, finalmente, estará para breve.

Imagem do Senhor Santo Cristo, Ponta Delgada

Imagem do Senhor Santo Cristo, em Ponta Delgada: os Açores deverão ter finalmente um novo bispo, após um ano sem o principal responsável da diocese de Angra. Foto © António Marujo/7Margens

  

Está para breve, finalmente e após largos meses de espera, a nomeação de novos bispos católicos para as dioceses de Angra (há um ano à espera, quando João Lavrador foi nomeado para Viana), Bragança (desde Dezembro, com a nomeação de José Cordeiro para arcebispo de Braga) e Setúbal (desde Janeiro, com José Ornelas a ser nomeado para Leiria-Fátima.)

A concretizar-se, esta informação, vinda de fontes eclesiásticas, porá fim a uma espera de meses, que padres das três dioceses consideram excessiva, atribuindo responsabilidades ao núncio do Vaticano em Portugal, Ivo Scapolo. Mas o 7MARGENS sabe que a razão pode estar também noutro lado: em todo o mundo, há cerca de 20% de presbíteros a recusar ser nomeados para bispos, conforme terá confidenciado o prefeito do Dicastério para os Bispos, o cardeal Marc Ouellet, a vários clérigos; e em Portugal, há já pelo menos três – dois de dioceses do Norte e um de uma do Centro – que também disseram que não ao convite para serem bispos.

De acordo com as informações recolhidas, Angra pode ser a primeira a ter novo responsável máximo da diocese. Talvez ainda este mês, é a expectativa de vários padres na diocese. Mas há quem diga que já não acredita na brevidade da resolução: “Nunca houve uma demora assim e não há razão para que tal aconteça, porque já houve processos a correr”, diz um presbítero de uma das dioceses ao 7MARGENS. “Não se percebe o que o núncio está a fazer para que haja esta demora toda”, acrescenta outro. Sobretudo, diz, sabendo-se que o bispo João Lavrador já manifestara nos Açores a sua vontade de ir para Viana do Castelo, antes de ser nomeado; que o actual arcebispo de Braga chegou a manifestar em privado, em Bragança, o seu desejo de, após meia dúzia de anos, transitar para outra diocese; e que José Ornelas saiu de Setúbal e foi para Leiria muito pelo empurrão do cardeal António Marto. Acrescenta aquele padre: “Se é para ter soluções das quais já se falava há muito, não era preciso esperar quase um ano em cada um daqueles casos e demorar outra vez este tempo todo com Angra, Bragança e Setúbal.”

Há mais de um mês, no dia 4 de Agosto, o 7MARGENS perguntou ao núncio, por correio electrónico, se seria possível ter uma perspectiva de até quando poderia haver novos bispos em cada uma das três dioceses, tendo em conta o ambiente de desânimo que reina entre boa parte do clero. Dias depois, ao insistir por telefone, uma das funcionárias da representação diplomática do Vaticano disse ao 7MARGENS que o núncio Ivo Scapolo dera instruções para que email não fosse respondido.

Para baralhar o problema, surgiu entretanto a questão de uma eventual mudança em Lisboa, conforme o 7MARGENS noticiou, caso o Papa decida antecipar a saída do patriarca, tendo em conta a proximidade da Jornada Mundial da Juventude, que decorre na capital de 1 a 6 de Agosto do próximo ano, aceitando a disponibilidade do cardeal para sair. 

Angra: “Temos fama de não sermos fáceis”
Nuno Almeida, bispo auxiliar Braga

Nuno Almeida, bispo auxiliar de Braga, um dos nomes de quem se fala para Bragança-Miranda. Foto: Direitos reservados.

Enquanto se espera pelas nomeações, faz-se a dança dos nomes que correm em conversas entre o clero ou entre alguns leigos com responsabilidade em dioceses.

Para Angra, tem aparecido o nome do actual administrador da diocese, Hélder Fonseca, mas um dos membros do clero açoriano diz que ele tem alguns “anticorpos” entre os padres da diocese. “Não é fácil ser bispo aqui nas ilhas”, diz um outro clérigo dos Açores. “A dispersão geográfica reforça os bairrismos, que infelizmente também existem na Igreja”. De qualquer modo, este presbítero está confiante que até final do mês surja a notícia da nomeação. “Talvez no dia litúrgico dos arcanjos”, a 29 de Setembro, diz.

Um outro padre diz que “a relação entre o clero e o bispo nunca é fácil”, mas que uma “condição essencial para se ser nomeado bispo deveria ser a de não o querer ser, ao contrário do que acontece com alguns que foram nomeados nos últimos anos”.

Outros dos nomes de que se fala nos Açores são os dos bispos das Forças Armadas, Rui Valério, e de São Tomé e Príncipe, Manuel António Mendes dos Santos – que é apontado também como hipótese para Setúbal. Mas comenta-se igualmente que poderá haver um jesuíta a ser nomeado ou António Manuel Saldanha, que trabalha em Roma, mas é visto por alguns padres como não estando na linha do Papa Francisco.

“Também sabemos que a alguns não agrada vir para os Açores”, diz um outro padre. “Temos fama de não sermos um clero fácil e a dispersão não ajuda.” Mas este clérigo acrescenta outras razões, mais históricas e de fundo: “No pós-Concílio [Vaticano II, na década de 1960], apareceu uma grande divisão teológica, pastoral e moral em toda a parte, mas aqui ela foi extremamente aguerrida. Alguns dos melhores abandonaram o ministério, por causa da [encíclica do Papa Paulo VI] Humanae Vitae [sobre o planeamento familiar].”

Desde essa crise, acrescenta, vários dos que têm um pensamento crítico abandonam o ministério, e por isso também o panorama de uma parte da hierarquia e do clero é “sofrível”, diz outro dos padres açorianos. “Angra é a segunda diocese com mais pessoas a estudar fora, depois de Braga”, acrescenta o mesmo clérigo. “E tínhamos um seminário aberto, onde se ensinava Psicologia, Sociologia, Nietzsche, Erasmo – não era ler sobre eles, éramos incentivados a ler autores como esses.”

Já para Bragança-Miranda, o actual bispo auxiliar de Braga, Nuno Almeida, é um dos nomes apontados, a par dos padres Joaquim Dionísio e João Morgado, ambos de Lamego, António Jorge Almeida (de Viseu, mas com o cargo de reitor do Seminário Interdiocesano em Braga) e Delfim Gomes, de Bragança. 

Desconforto entre bispos

Pelos vistos, adiantam fontes eclesiásticas da diocese, o processo terá ido directamente para Roma depois de feita a auscultação inicial. Ou seja, a nunciatura (embaixada) do Vaticano em Lisboa, que coordena estes processos, reuniu informação e, em vez fazer a lista com três nomes que sujeita depois à apreciação dos padres da diocese, terá enviado directamente a lista para Roma. Nessa auscultação inicial, vários presbíteros e outras pessoas são chamados a pronunciar-se, a propósito de um questionário que tenta averiguar as qualidades morais e a disciplina eclesiástica do candidato, mas que nunca fala do Evangelho, como o 7MARGENS já contou, quando publicou o questionário na íntegra.

Entre pelo menos alguns bispos portugueses, este método provoca algum desconforto, por concentrar toda a decisão nas mãos de uma pessoa só – no caso, o núncio. “Ele pode consultar quem entender na diocese ou fora e mandar a lista para Roma, sem que se saiba se ela corresponde às pessoas mais consensuais”, lamenta um deles.

Em Setúbal, finalmente, no quadro de “uma diocese sem rosto, sem liderança, em que cada um neste momento faz o que entende”, há um sentimento de “orfandade”, diz um padre ouvido pelo 7MARGENS. Outro pensa que, pelo contrário, a diocese “vai funcionando”. Fala-se, também aqui, dos nomes do bispo auxiliar do Porto, Armando Esteves, e do de São Tomé, Manuel Mendes dos Santos.

Mas um membro do clero setubalense também admite que não é fácil para alguém aceitar ser bispo na diocese: caracterizada por ter um importante grupo de padres ligados ao movimento Comunhão e Libertação, de pendor mais conservador, o clero está “muito dividido”, diz.

Um outro padre açoriano confirma a observação, contando que há cerca de dois anos esteve com um grupo de padres de Setúbal que visitaram a região, acompanhados do bispo Ornelas: “Só havia dois sem cabeção e um deles era o bispo. Um deles andava de cabeção e calções, não percebendo sequer o ridículo.” Mas este padre não se admira: “O que atrai hoje mais muitos seminaristas e padres novos é uma estrutura psicossocial única, uma orientação sexual que não se entende bem e um estilo tridentino”, lamenta.

In 7 Margensaqui. O negrito é nosso

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