Numa sociedade marcada por códigos de condutas rígidos e hierarquizados, só os hierarquicamente inferiores (filhos, netos, sobrinhos, genros/noras) e os colegas eram tratados por "tu". Palavras como "senhor(a)", eram reservadas para pessoas como o professor, o padre, o médico, o advogado ou alguém rico e importante que aparecesse. O Tratamento normal entre as pessoas da aldeia era "tio/a", quando se tratava de gente mais velha, mesmo que não muito mais velha. Palavras como "Dom e Dona", não eram usadas a não ser para referir alguém marcado por uma linhagem nobre.
Os colocados na hierarquia familiar inferior, em cada dia que encontrassem o correspondente hierarca, pediam-lhe a bênção. "Sua bênção, meu pai"; "sua bênção, minha mãe"; "sua bênção, meu avô"; "sua bênção meu tio"; "sua bênção, minha sogra"... E então ouvia-se a resposta: "Deus te abençoe". Ah! E em algumas famílias, o tratamento era ainda mais reforçado. O filho, quando se dirigia ao pai ou à mãe, dizia: "Senhor meu pai ... Senhora minha mãe..." Mas esta forma estava claramente em desuso já naquele tempo.
Era tida por má educação qualquer forma de tratamento que não obedecesse a estes códigos. E tratar os pais por tu era coisa completamente impensável na altura.
Os jovens eram muitos e marcados por forte espírito de obediência e reverência para com os pais. Mesmo quando refilavam, sabiam bem as marcas para além das quais não podiam ir, caso contrário chovia-lhes no corpo. Os grandes momentos de encontro eram as tardes de domingo e os tempos de serviço agrícola que envolviam mais gente. As avessadas e as ceifas traziam enorme animação. Cantavam enquanto ceifavam, dançavam quando passavam de uma leira para outra e à noite, na eira, surgia um breve bailarico enquanto esperavam pela ceia. Entretanto, as piadas, as brincadeiras e maroteiras sucediam-se. Claro, sem abusos.
As raparigas, então, eram fortemente controladas. Desonrava a família moça que não casasse virgem. Os namoros aconteciam em lugares públicos ou à porta de casa dos pais da rapariga. E quando os namorados tinham que se ausentar, para ir à Igreja, ao moinho ou a outro lado, nunca iam os dois sozinhos. Um irmão mais novo, um sobrinho, a mãe... acompanhavam-nos. Depois nem os pais nem os namorados usavam palavras como namorar, namoro. Diziam "Eu falo com fulano(a)".
Os namorados nunca estavam muito juntinhos e nada de toques, beijos outras formas de expressão que envolvessem mais intimidade. É que qualquer atitude menos própria punha em causa a reputação da rapariga. E isso era o pior que lhe podia acontecer.
Numa terra onde havia poucas notícias e com a tendência de falar dos outros, os namoricos eram tema recorrente de conversa e examinava-se à lupa cada casalinho. E expressões como "estão bem um para o outro"; "coitada rapariga, não sabe com que raça se vai meter"; "pobre rapaz, merecia bem melhor"... sintetizavam conversas onde eram dissecados os vários namoricos.
As moças casavam cedo, fosse para se livrarem do controle paterno, fosse pelo receio de ficar para tia. Rapariga com mais de 25 anos, solteira, na boca do povo iria ficar para tia, porque nenhum rapaz lhe pegaria...Muitas delas vinham a ter saudades muito rapidamente do tempo de solteiras. Num contexto social fortemente machista, a vida de esposa era tudo menos fácil...
Claro que apareciam "escândalos", tanto maiores quanto maior era o estrato social da envolvida. E quando aparecia uma gravidez, a pressão familiar e social em prol do imediato casamente exercia-se de modo galopante. Nem sempre a vigilância era suficiente, porque a imaginação se lhe superiorizava. Daí o ditado: "Ninguém nos guarda se nós não nos guardarmos a nós próprios."
Havia raros casos de raparigas muito pobres que tinham tido uma queda. Depois, com um filho nos braços, devoradas pela miséria e pelo abandono, iam dando o corpo a troco de uma fatia de pão. E os abutres apareciam sempre, abrigados por uma maior condescendência em relação ao homem e pelo silêncio que empunham à vítima.
Os colocados na hierarquia familiar inferior, em cada dia que encontrassem o correspondente hierarca, pediam-lhe a bênção. "Sua bênção, meu pai"; "sua bênção, minha mãe"; "sua bênção, meu avô"; "sua bênção meu tio"; "sua bênção, minha sogra"... E então ouvia-se a resposta: "Deus te abençoe". Ah! E em algumas famílias, o tratamento era ainda mais reforçado. O filho, quando se dirigia ao pai ou à mãe, dizia: "Senhor meu pai ... Senhora minha mãe..." Mas esta forma estava claramente em desuso já naquele tempo.
Era tida por má educação qualquer forma de tratamento que não obedecesse a estes códigos. E tratar os pais por tu era coisa completamente impensável na altura.
Os jovens eram muitos e marcados por forte espírito de obediência e reverência para com os pais. Mesmo quando refilavam, sabiam bem as marcas para além das quais não podiam ir, caso contrário chovia-lhes no corpo. Os grandes momentos de encontro eram as tardes de domingo e os tempos de serviço agrícola que envolviam mais gente. As avessadas e as ceifas traziam enorme animação. Cantavam enquanto ceifavam, dançavam quando passavam de uma leira para outra e à noite, na eira, surgia um breve bailarico enquanto esperavam pela ceia. Entretanto, as piadas, as brincadeiras e maroteiras sucediam-se. Claro, sem abusos.
As raparigas, então, eram fortemente controladas. Desonrava a família moça que não casasse virgem. Os namoros aconteciam em lugares públicos ou à porta de casa dos pais da rapariga. E quando os namorados tinham que se ausentar, para ir à Igreja, ao moinho ou a outro lado, nunca iam os dois sozinhos. Um irmão mais novo, um sobrinho, a mãe... acompanhavam-nos. Depois nem os pais nem os namorados usavam palavras como namorar, namoro. Diziam "Eu falo com fulano(a)".
Os namorados nunca estavam muito juntinhos e nada de toques, beijos outras formas de expressão que envolvessem mais intimidade. É que qualquer atitude menos própria punha em causa a reputação da rapariga. E isso era o pior que lhe podia acontecer.
Numa terra onde havia poucas notícias e com a tendência de falar dos outros, os namoricos eram tema recorrente de conversa e examinava-se à lupa cada casalinho. E expressões como "estão bem um para o outro"; "coitada rapariga, não sabe com que raça se vai meter"; "pobre rapaz, merecia bem melhor"... sintetizavam conversas onde eram dissecados os vários namoricos.
As moças casavam cedo, fosse para se livrarem do controle paterno, fosse pelo receio de ficar para tia. Rapariga com mais de 25 anos, solteira, na boca do povo iria ficar para tia, porque nenhum rapaz lhe pegaria...Muitas delas vinham a ter saudades muito rapidamente do tempo de solteiras. Num contexto social fortemente machista, a vida de esposa era tudo menos fácil...
Claro que apareciam "escândalos", tanto maiores quanto maior era o estrato social da envolvida. E quando aparecia uma gravidez, a pressão familiar e social em prol do imediato casamente exercia-se de modo galopante. Nem sempre a vigilância era suficiente, porque a imaginação se lhe superiorizava. Daí o ditado: "Ninguém nos guarda se nós não nos guardarmos a nós próprios."
Havia raros casos de raparigas muito pobres que tinham tido uma queda. Depois, com um filho nos braços, devoradas pela miséria e pelo abandono, iam dando o corpo a troco de uma fatia de pão. E os abutres apareciam sempre, abrigados por uma maior condescendência em relação ao homem e pelo silêncio que empunham à vítima.
sim, senhor muitos anos de pesquisa ou experiência?
ResponderEliminarlanço o desafio de falar nos cinquenta anos seguintes a evolução dos tempos e das gentes da nossa terra.
Cara visitante:
ResponderEliminarObrigado pela visita e pelo comentário.
Por maneira de ser, gosto mais de falar do presente e de sonhar o futuro do que estar a evocar coisas do passado.
Se o tenho feito e o vou continuar a fazer durante mais algum tempo, é para responder a pedidos que me têm chegado, sobretudo oralmente. E é interessante, tem havido gente nova a solicitar este tipo de postagens, o que a mim mesmo me deixou espantado...
Não tenho feito pesquisa propriamente dita. Apenas a recordação de vivências do passado que vou procurando organizar com a fidelidade possível.
Quanto ao desafio lançado, acho-o pertinente. Mas também deixo a si e a outros visitantes o mesmo desafio: "falar nos cinquenta anos seguintes a evolução dos tempos e das gentes da nossa terra."
Terão neste humilde blog porta aberta para essa intervenção.
Muita paz