O que está a acontecer, no nosso país, só surpreende quem anda desatento, o que não é susposto acontecer com um cidadão minimamemte informado.
Não obstante, é deveras doloroso acompanhar o que está a acontecer.
As eleições para a presidência da república confirmam uma tendência que, há muito, se vem desenhando e infirmam qualquer vontade de acreditar que, afinal, o melhor ainda é possível.
Os candidatos apresentaram os seus manifestos com ideias e programas.
Contudo, a realidade reduzida à comunicação não se faz eco de qualquer ideia ou programa.
Não há ideias nem programas porque isso (supostamente) não cativa. Sobra a suspeita porque isso (supostamente) atrai.
Estas eleições estão para a política como, por exemplo, O Código da Vinci esteve para a literatura: a suspeita vende, a suspeita rende.
Como é habitual nestes casos, não se procura a globalidade. E desde Aristóteles é sabido que a verdade está na totalidade. O Estagirita dizia, na sua Metafísica, que a verdade era católica. Católico aqui não é confessional (Aristóteles viveu antes de Cristo), mas genuinamente etimológico, no sentido de universal, englobante.
Na suspeita, vale uma parcela, um alvitre. E, como se compreende, se a estratégia é a suspeita, nada melhor que conseguir uma suspeita sobre quem lança suspeita.
A suspeita facilmente conduz à desconstrução. As provas aqui são pouco relevantes. A predisposição parece contar mais.
E não há dúvida de que, hoje em dia, a predisposição para o o boato e o rumor é grande, é total.
A suspeita é tecida sob a forma de veneno letal e servido ao jeito do espectáculo.
Com a suspeita não se pretende questionar ou discordar. Com a suspeita visa-se atingir, denegrir, eliminar (pelo menos, a dignidade).
É só ver o ar impante e superior com que se fala destes assuntos. Esquece-se, porém, que, não raramente, a suspeita lança estilhaços imprevistos e ninguém está livre de apanhar com alguns.
Perturba olhar o olhar feliz de quem tem a última suspeita para apresentar. E como se faz moralismo para os outros.
O pior é que as novas gerações, ao entrarem na vida pública, já sabem com o que contam. Suspeitar de alguém é considerado mais aliciante que propor algo ou, legitimamente, criticar alguma coisa.
Nietzsche, Marx e Freud foram apontados como os mestres da suspeita. Em planos diferentes, têm discípulos que lhes levam a palma na perfídia e na astúcia.
Confesso que nada disto entusiasma. Todos acabamos por replicar aquilo que contestamos.
A comunicação social, que podia (e devia) exercer um papel terapêutico, parece excitar-se com tudo isto. Parece mesmo (sobre)viver bem neste território lamacento.
Até aposto em como a entrevista desta noite com mais um candidato vai andar em torno deste (penoso e já entediante) tema.
Custa viver num tempo assim. A honra é muito importante. A política é muito nobre.
Há quem me tenha alertado, desde há muito, para o facto de acreditar naquilo que não existe. Tem razão. O problema é que naquilo que existe é que não posso mesmo acreditar.
Apesar de tudo, creio que uma revolução silenciosa está a fermentar. A longo prazo, dará os seus frutos.
O bem não se compadece com pressas. É pena. Mas parece que é assim.
Texto retirado DESTE blog
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