Os dias passavam-nos a dormir e a curtir as bebedeiras, porque só funcionavam de noite
O Gustava e a Joana têm um filho de 8 anos - o Pedro.
Um dia o Gustavo chegou a casa antes da mulher e pôs-se a brincar com o filho. No meio da brincadeira, saiu-lhe um pergunta que fez ao filho e que pode considerar-se uma insensatez.
- Diz-me de quem gostas mais, do papá ou da mamã?
O Pedro ficou um pouco calado e respondeu:
- De quem eu gosto mais é da Rosa e do Jacinto (o jardineiro).
O pai ficou sério e perguntou-lhe a razão da sua preferência. O filho começou então o seu "discurso":
- Sabes, papá, por que gosto muito da Rosa? Quando chego a casa da escola, ajuda-me a tirar a mochila e o casaco e depois de me mandar lavar as mãos, serve-me o lanche. Eu já sei que tenho sempre à minha espera qualquer coisa de que gosto muito: ou bolachas que ela fez para nós, ou bolo de chocolate, ou um gelado de morango de que tanto gosto. Depois manda-me brincar um bocadinho, avisando que eu devo voltar logo que ela me chame, para fazer os trabalhos de casa.
Quando está bom tempo, manda-me brincar para o jardim, para o pé do Jacinto. Gosto muito dele também, porque me ensina o nome das plantas que cultiva, o nome dos bichos que aparecem; explica-me como se cuida das plantas e o que é preciso para sejam tão bonitas. Diz-me muitas vezes que "conversa" com as flores, pois que elas são como as pessoas - gostam que se lhes dê atenção. 'Olhe, menino, diz-me ele, o menino não gosta que falem consigo? Pois as plantas, apesar de não terem ouvidos, também gostam.'
O Gustavo ficou pensativo com o que ouviu e à noite teve um longa conversa com a mulher. Era preciso prestar mais atenção ao filho, mesmo que isso implicasse menos tempo fora de casa no trabalho profissional. Ainda estavam a tempo de emendar o seu comportamento, porque o filho só tinha 8 anos.
Pensemos então agora no drama da morte daquele adolescente que morreu em Espanha, quando integrado num passeio de fim do secundário.
O que li não foi novidade. O jovem interrogado disse que os dias passavam-nos a dormir e a curtir as bebedeiras, porque só funcionavam de noite. Assim é que eram férias: muito álcool, droga e sexo (seguro!).
Quem vigiava o grupo? Não sei. Sei que, quando era professora, calhou-me ter de acompanhar um grupo misto de finalistas do secundário. Primeiro, funcionavam de dia e, à noite, eu e a colega que ia comigo não nos deitávamos para acompanhar (discretamente) as raparigas numas inocentes serenatas que eles faziam, da rua debaixo do hotel onde estávamos, sim, porque eles... ficavam noutro hotel com dois professores.
Será que este drama fará pensar alguns pais na necessidade de prestarem mais atenção aos filhos? Com 17/18 anos, sozinhos ou sem ninguém a ter mão neles, dá o resultado que aquele entrevistado relatou sem pudor.
Nada nas minhas palavras culpabiliza a família (pais, sobretudo) do jovem que faleceu - basta-lhes a dor e as suspeitas estúpidas que alguma comunicação social já começou a levantar.
Maria Fernanda Barroca, in Jornal da Beira
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