quarta-feira, 7 de outubro de 2020

IGREJA = LOJA DE CONVENIÊNCIAS

 Por este andar, a Igreja – una, santa, católica e apostólica - tem os dias contados. Os seus líderes (sobretudo padres e bispos), na ânsia de não perder protagonismo e privilégios, receitas, “peso social” (e conservar os ofícios) acabam por a reduzir a uma agência de serviços. Muitas delas não passam de espaços usados para eventos sociais: batizados, casamentos, funerais, primeiras comunhões, “comunhões solenes”, crismas ou festas familiares. Para a maioria dos comensais, onde está a fé? Que lugar ocupa Deus? Uso, à laia de exemplo, os batismos…
A administração do Batismo pressupõe a fé do candidato (se batizado em idade adulta) ou dos pais e padrinhos (se batizado ainda em criança) e a comunhão com a Igreja: «Para que a criança seja licitamente batizada, requer-se que haja esperança fundada de que ela irá ser educada na religião católica; se tal esperança faltar totalmente, difira-se o batismo, segundo as prescrições do direito particular, avisando-se os pais do motivo» (CDC 868).
Que esperança haverá de ser “educada na religião católica” uma criança cujos pais não põem os pés na igreja, não veem importância em “casar pela igreja” (“o amor basta”!), não acham piada à Missa ou defendem/seguem práticas e propostas ofensivas da fé católica (reencarnação, astrologia, cartomancia, bruxaria, reiki e outras filosofias orientais)?
É doloroso (intragável, doentio) assistir à desfaçatez com que muitos pais e padrinhos brincam com as “coisas de Deus” e enganam atrevidamente, logo nos procedimentos prévios, ao apresentar desculpas para tudo: “não temos tempo” (para Deus… porque têm tempo para desporto, caminhadas e passeios, jantares e fins de semana, viagens e festas à brava); “gostamos mais de rezar sozinhos, quando nos apetece” (se a fé se faz de apetites e gostos pessoais, porque precisam da igreja?); “temos de batizar não vá acontecer alguma coisa”… Santa ignorância! O Papa Bento XVI teve o cuidado de escrever sobre o assunto (inexistência do “Limbo”), mas desconhecem ou não aceitam a sua doutrina (tão evoluídos?): “A esperança de salvação para as crianças que morrem sem batizar.” (19 de Janeiro de 2007)
A própria celebração não será um embuste? Atendam ao diálogo entre o celebrante (em nome da igreja) e os pais: «Caríssimos pais: Pedistes o Batismo para o vosso filho (a vossa filha). Deveis educá-lo (educá-la) na fé, para que, observando os mandamentos, ame a Deus e ao próximo, como Cristo nos ensinou. Estais conscientes do compromisso que assumis?»
Os pais respondem: “Sim estamos”. Ou seja, “somos católicos não praticantes, não concordamos com quase tudo na Igreja, não valorizamos os sacramentos da Eucaristia e/ou do Matrimónio, confessamo-nos diretamente a Deus, etc., mas queremos educar catolicamente na fé da Igreja! Uau! Parabéns! Magnífica coerência e honestidade!
Logo adiante, na renúncia ao pecado e na profissão da fé, é-lhes lembrado e perguntado:
«Caríssimos pais e padrinhos: No sacramento do Batismo, a criança por vós apresentada vai receber do amor de Deus uma vida nova, pela água e pelo Espírito Santo. Procurai educá-la de tal modo na fé, que essa vida divina seja defendida do pecado que nos cerca e nela cresça de dia para dia. Se, guiados pela fé, estais preparados para assumir esta missão, recordai o vosso Batismo, renunciai agora, de novo, ao pecado e professai a vossa fé em Jesus Cristo, que é a fé da Igreja, na qual as crianças são batizadas.»
“Se, guiados pela fé, estais reparados”? Claro! Preparadíssimos. Aliás, até se dispõem a renunciar ao pecado, a Satanás, às suas obras e seduções… E embalados (entusiasmados) nesta renúncia até acabam por renunciar também às perguntas sobre a fé em Deus: “Credes em Deus, Pai todo-poderoso, criador do céu e da terra?” “Sim, renuncio”, a talho de foice…
Também pouco importa que a oração conclusiva lhes fale da fé no plural: “Esta é a nossa fé. Esta é a fé da Igreja, que nos gloriamos de professar, em Jesus Cristo, Nosso Senhor”. Entrou a cem, saiu a duzentos: “eu cá tenho a minha fé”, retrucam interiormente.
E a veste branca? “Sr. Padre, não pode ser um fatinho “à marinheiro” ou um vestidinho mais colorido? Ficava bem mais engraçado…” Pois… Ponha lá o que quiser… afinal já há muito que a sua palavra e as palavras de Deus não têm conteúdo, são palavras mortas a enfeitar tão-só uma encenação social. Mesmo assim, não deixe de pensar no que diz a oração sobre a veste branca, a palavra, o exemplo: «Filhinho, Agora és nova criatura e estás revestido de Cristo. Esta veste branca seja para ti símbolo da dignidade cristã. Ajudado pela palavra e pelo exemplo da tua família, conserva-a imaculada até à vida eterna.»
Em muitos batismos, como em outras celebrações, lembro-me muitas vezes das palavras de Jesus: «Não deis o que é santo aos cães, nem lanceis as vossas pérolas aos porcos, não aconteça que eles as espezinhem com as suas patas e, voltando-se, vos destrocem» (Mt 7, 6). Não andaremos a brincar, (gozar, abusar) com/de Deus?
É engraçado assistir à antipatia/simpatia (até revanchismo, anticlericalismo) à volta de padres e bispos em virtude de serem melhores ou piores facilitadores de serviços, satisfazerem ou não os mais (a)variados gostos, caprichos, interesses dos clientes do sagrado. A Igreja está a tornar-se numa loja de conveniências, Jesus (o Evangelho, os valores, a Fé enquanto relação/encontro de amor plural) um produto caído em desuso e os padres os novos merceeiros. Quanto mais solícitos, melhores.
(P. António Magalhães Sousa, in Sopro e vida)

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