quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A ESTRADA

Raro é o jornal de Tarouca em que eu não leia, com agrado e desgrado, a notícia de mais uma estrada. Assim como a epidemia das rotundas por tudo quanto era sítio, assim são agora as estradas. Lembro-me duma história engraçada que vem a propósito desta tendência de imitar os outros sem outro propósito que não seja a imitação. Numa determinada paróquia, o novo pároco verificou com desgosto que as paredes dum lado e do outro da igreja paroquial estavam todas pretas de fuligem e de cera. Perguntou a alguém do que se tratava e responderam-lhe que era costume os homens que acompanhavam a procissão com círios acesos, ao entrarem na igreja, em vez de apagarem os círios com um sopro, esmurravam-nos na parede da entrada. O novo pároco mandou pintar e limpar as paredes e avisou, à saída da procissão que não sujassem de novo as paredes com os círios ao voltar. Quando a procissão recolheu, para prevenir qualquer infrator, pôs-se o pároco a observar os homens que iam entrando com os círios acesos. Todos os apagavam com um sopro ao verem o pároco a observá-los. Porém um homem mais velho, ao entrar, olhou para o pároco e para o círio aceso e num repente exclamou: ”o meu pai esmurrou e eu também hei-de esmurrar” — dizendo isto apagou o círio contra a parede.
Que tem isto a ver com as estradas? Abrem-se estradas porque se julga que o progresso das terras está nas estradas, não refletindo que não é pelo facto dos outros as fazerem que são mais progressistas. Mas como os outros as fazem, eu também as faço. E se há outras vilas que sobem a cidade porque não a minha? Que algumas estradas sejam necessárias é uma evidência que ninguém nega. Que as estradas só por si tragam progresso, sobretudo as vias rápidas tem que ser demonstrado.
Acho que algumas estradas só devassam e estragam o ambiente, poluem a atmosfera com os carros que passam, provocam incêndios e desastres mortais. Os que são da minha idade, quando eram jovens alguma vez viram a Serra de Santa Helena a arder? Eu nunca vi. E agora? Com os carrinhos carregados lá vão serra acima fazer os seus piqueniques e assarem as suas sardinhas. Lixo e fogo.
 Alguém observou que as estradas que servem para entrar numa terra, também servem para sair. Em Tarouca acho que são mais para sair que para entrar. Não penso que elas sejam a varinha mágica do progresso porque esse progresso tem mais a ver com as pessoas que habitam determinada zona do que com múltiplas estradas.
Ao longo dos tempos houve muitas vilas e aldeias que se desenvolveram porque eram atravessadas por uma estrada, mas com as auto-estradas e vias rápidas, nada disso acontece. Ë a velocidade, é a pressa que não dá para parar e tomar um café, comprar uma recordação e até quem sabe, dormir uma noite. Todos têm pressa e as estradas modernas atiçam essa pressa. Gastamos milhões a construir estradas para nada. Mas os outros têm, eu também tenho que ter. As ilusões pagam-se caras .Ate os ladrões têm espaça para fugirem e os incendiários ocasião para destruírem a floresta. Senhores autarcas pensem bem antes de imitarem os outros.
Carlos A,Borges Simão

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