Dia dos Avós
Até ao cimo da íngreme ladeira,
ficava a casa de enorme paredes cercada.
Dava-lhe acesso o portão de madeira,
de aldraba negra, em ferro bem forjada.
«Abram a porta!» - Gritava a avó chamando.
«Abram a porta que o pastor quer entrar!»
As doces pombas espantavam-se em bando,
iam serenas no telhado poisar.
O pátio enorme cheirava a rosmaninho,
a feno verde, a cidra, a hortelã.
Os pardalitos pipiavam no ninho,
entontecidos com o sol da manhã.
Casa de agricultor! Tanto trabalho,
tanta lida, tanta vida, tanto ardor!
No tempo da azeitona, ceifa ou malho,
Trabalhavam até o sol se pôr!
Um grilo tonto na lareira escondido,
uma cigarra perdida no pomar,
a toutinegra com o seu alarido
compunha árias em noites de luar.
Vinha o cheiro de mosto do lagar,
vinham sacos de farinha do moinho,
vinha azeite da talha a gotejar,
vinha fruta, hortaliça, pão e vinho.
Primeiro foi a avó que foi embora,
cansada de trabalho e de sofrer.
Em cada mês, em cada dia, em cada hora,
doce lugar ficou por preencher.
E houve um dia em que todos partiram,
malas na mão e na garganta um nó.
Morreram uns, outros logo fugiram
ao trabalho da terra feita pó.
Fechou-se a casa, o avô ficou só;
Alquebrado, queixoso, sem ninguém…
E começou a andar… metia dó…
pela casa dos filhos: um vai/vem…
Envelheceu a casa. Em todo o lado,
Cresciam ervas…tudo era solidão.
Subiam as silvas até ao telhado
E cogumelos enfeitavam o chão.
Mas, um dia o milagre aconteceu.
Alguém a viu, alguém a desejou,
e a Casa do Pombal que se perdeu
numa alegre moradia se tornou.
Casa dos meus avós, das minhas tias,
da minha infância feliz e descuidada,
passo por ti e só sinto alegrias,
ao ver tuas paredes restauradas.
Sejam felizes os que vivem nela,
os que enfeitaram de flores a calçada,
pois colocaram vasos na janela
e fizeram da casa uma pousada.
Quando vou a Foz de Arouce de abalada
e antevejo essa casa florida,
encho de amor a minha madrugada;
São meus avós o chão da minha vida.
Maria Helena Amaro
Inédito
Braga, julho 2013
Fonte: aqui
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