Ainda falta liberdade quando há quem trabalhe o mês inteiro e continue a não saber se vai conseguir pagar a renda. Quando há quem adoeça e tenha de esperar meses por um tratamento, como se o tempo pudesse ser negociado. Falta liberdade nas filas de quem procura casa, nas prateleiras vazias de quem escolhe entre aquecer a casa ou alimentar os filhos. Falta quando o elevador social está avariado e só sobe para alguns.
Falta liberdade quando se envelhece sozinho, sem cuidados nem companhia, como se a velhice fosse castigo e não coroa. Quando as mulheres ainda são mandadas calar, ou quando se levantam vozes contra quem ama de forma diferente, veste diferente, reza — ou não reza — de maneira própria. Falta liberdade onde ainda se tem medo de ser quem se é.
Falta liberdade quando se estuda com fome. Quando se desiste dos sonhos por cansaço. Quando se vive nas margens da cidade, sem acesso à mesma dignidade de quem vive no centro. Falta liberdade quando a cultura é luxo e não direito, quando a política parece distante e a justiça pesa mais sobre os que menos têm.
E, ainda assim, o espírito de Abril permanece. Não como memória que se repete, mas como impulso que nos convoca. A liberdade é viva ou não é. É presente ou é perda. E não se faz apenas de palavras, mas de condições reais: acesso, cuidado, escuta, partilha. É pão na mesa, tempo para os filhos, saúde no corpo, futuro nas mãos.
O cravo do 25 de Abril ainda floresce, sim — mas há muitos canteiros por cuidar. E a luta, essa, continua. Porque a liberdade só é verdadeira quando cabe dentro da vida concreta de todos. Até lá, não está completa.
Fonte: Padre João Torres, Facebook
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